No
meu tempo de ginasiano em Itaúna, tive a sorte de estudar no Colégio e Escola
Normal da cidade sob a diretoria de Guaracy de Castro Nogueira. Um homem
afável, amigo dos alunos e empreendedor sem limites.
Sempre
inovando. Com poucos recursos, transformou o vetusto educandário. Construiu uma
quadra polivalente, introduziu basquete e voleibol, ginástica moderna, salto
altura e salto com vara, salto à distância, gincanas e brincadeiras. Fui muito
bom em corrida de saco, carrinho de mão e outras brincadeiras para os menores.
Para as moças, além do vôlei e da ginástica, corrida de ovo na colher, evoluções com arco, fitas e treino para balizas. Fez muito mais. Merece um capítulo inteiro de seus feitos. Incentivava também o gosto pelas letras e a oratória.
Para as moças, além do vôlei e da ginástica, corrida de ovo na colher, evoluções com arco, fitas e treino para balizas. Fez muito mais. Merece um capítulo inteiro de seus feitos. Incentivava também o gosto pelas letras e a oratória.
De
tempos em tempos reunia todos os alunos no auditório. Sessões de corais, jogral,
recitativo e outras atividades que objetivavam o convívio social, o bom
relacionamento e o cultivo de boas práticas.
Na
sua administração, foi criado um jornal interno. Se não me engano, tinha o nome
de Gladio - assim mesmo, em latim.
Tinha como divisa: "gladiator in
arena consilio caput". O gladiador na arena corta cabeças. Publicado
mensalmente, impresso na Tipografia Nívia, trazia a colaboração de alunos e
professores. Um sucesso.
Uma
das atividades mais concorridas e esperadas era o concurso de oratória. Manoel
Bernardes, mais conhecido como "Manoelzinho", desde a primeira série
de ginásio, se destacava nessa atividade. Tinha o dom da oratória. Sabia a
língua, tinha vocabulário, entonação e respiração corretas. Um futuro advogado.
Não deu outra.
Cursou
Direito em Belo Horizonte. Bom aluno, pequeno e mirrado, crescia quando a
palavra lhe era dada. Tinha domínio de palco e de plateia. Formado, filho de
pais pobres, voltou para Itaúna.
Tinha
talento. Começou a exercer a profissão como estagiário do dr. José Luiz
Gonçalves Guimarães. Professor de inglês, grande orador e ótimo penalista. Ver
o dr. José Luiz em uma sessão de júri era um espetáculo.
A
cidade, pacata e sem crimes se alvoroçava em dia de julgamento. Coisa rara.
Quando ocorria, um programa imperdível. Pena que sempre era proibido para
menores de dezoito anos.
Tal
proibição foi relaxada uma única vez. Na estreia do Manoelzinho, o juiz de
direito abriu uma exceção. Deixou entrar na sala do júri, os menores de dezoito
anos e acima de dezesseis. Um alvoroço.
O
fórum funcionava no velho solar dos Cerqueira Lima, na rua Silva Jardim. O novo ainda era promessa e o velho tinha
sido demolido. A sala de debates estava apinhada. Um calor de arrebentar
mamona. Gente pendurada nas janelas, nos pendentes de luz e amontoados na
porta. Manoelzinho era assistente da defesa. A cidade inteira torcendo pelo seu
sucesso.
Ritual
cansativo. Sorteio de jurados, leitura dos autos, acusação a cargo da
promotoria e enfim, a palavra de Manoelzinho.
De
terno, pequeno, aparecia aos olhos dos presentes, como menor ainda. Por pouco
tempo. Tinha bom timbre de voz, apesar de tê-la ainda jovem. Sabia o que queria
e conhecia do "riscado”.
Em
pouco tempo, cresceu no plenário. Tinha total domínio do " mis en scene" e do público. Gestos
estudados, no momento certo. Sabia arrebatar.
Em
pouco tempo fez seu arrazoado. Citava códigos, jurisprudência e doutores do
direito.
Demoliu
os argumentos da acusação. E pasmem: era apenas o assistente do "Mestre
José Luiz”.
Aos
olhos de seus pais, o filho era motivo de orgulho. Não só dos pais. A cidade
inteira "lambia a cria". Manoel Bernardes, o menino mirrado dos
concursos de oratória fez jus à fama que conquistara desde os tempos de
ginásio.
Ao dr. José Luiz, coube apenas o trabalho de respaldar a defesa do pupilo. O réu foi absolvido por unanimidade. A cidade inteira festejou.
Ao dr. José Luiz, coube apenas o trabalho de respaldar a defesa do pupilo. O réu foi absolvido por unanimidade. A cidade inteira festejou.
Cá
entre nós: acredito que até o Promotor gostou do resultado!!!!!
Texto: Urtigão
(desde 1943) é pseudônimo de José Silvério Vasconcelos Miranda, que viveu em
Itaúna nas décadas de 50 e 60. Texto enviado especialmente para o blog Itaúna
Décadas em 22/04/2017.
Organização: Charles Aquino
Organização: Charles Aquino