José
Batista Guimarães, filho do saudoso Delzir Batista sempre foi um gozador nato.
Conhecido como Zé do Delzir, em certa quadra da vida dizia que dali por diante
seria somente Zé. Segundo ele, comprara a parte do pai.
Éramos
vizinhos na rua Direita. O pai, tinha uma fazenda lá pelos lados de Itatiaiuçu.
Terra de minério, ruim de cultivo. No entanto, tratavam a gleba com todo
carinho. Dava prejuízo.
Certa
feita resolvera " terracear" uma encosta para plantar laranjas. Contrataram
um trator de uma firma memorável. Os proprietários: Aldo
"preto"Chaves, Plauto "escorpião"Machado e o Inacinho. Três
sócios exemplares. Sem reparos.
Aprontados
os terraços e prontas as covas, chegara a hora de plantar as mudas. Coisa fina,
vindas de Lavras, compradas na Escola de Agronomia. Eu estava
"flanando" quando Zé do Delzir me convidou. Ir com ele na Vila
Mozart, acertar com dois conhecidos para plantarem as mudas na fazenda.
O
primeiro deles, de nome Viriato, amigo dos Batista, acertou tudo com o Zé, que
disse-lhe com seriedade: " Viriato, lá tem serviço pra uma semana. Você
ficará hospedado por lá. Basta levar umas duas mudas de roupa. Tem cama e
comida. Vou " palavrar" alguém para lhe ajudar. Você não o conhece.
Trata-se do Fidélis, homem bom de serviço e compadre do meu pai. Gente boa. Só
tem um senão: é surdo que nem uma porta de braúna, quando você conversar com
ele, fale bem alto.
Isso
feito, fomos a procura do Fidélis que morava na Vila Padre Eustáquio. Mesma
conversa travada com o Viriato. No final, a advertência: estou levando para te
ajudar lá, o Viriato. Homem sério e trabalhador. Só tem um reparo: é surdo que
nem um teju. Quando, falar com ele, grite bem alto para ele ouvir.
No
dia seguinte cedo, apanhamos os pseudo-surdos
bem cedo. Aboletados na carroceria da caminhonete, travaram conhecimento por meio
de uma gritaria infernal. Da cidade até a fazenda. Trocaram de roupa, apanharam
os apetrechos para a lida e continuaram o berreiro. Afinal, para todos efeitos,
eram surdos.
A
"latomia" continuou por
todo o dia. Da casa da fazenda, ouvíamos claramente o berreiro. O serviço rendia, os homens ficaram roucos e de
cabeça doendo, tamanha era a gritaria. Na hora do jantar, pudemos constatar que
os dois trabalhadores estavam à beira de um ataque. Caras fechadas. Não queriam
conversa.
À
mesa, infelizmente, tiveram de gritar um para o outro. " Me passa a carne,
disse o Viriato"
"Já
vai, retrucou o Fidélis". Aproveita e me passa o arroz. Gritos para pedir
o feijão, o angu e o guisado. Zé do Delzir com as bochechas infladas para não
gargalhar. Por fim, com os tímpanos a estourar, o Viriato virou-se para o
Fidélis e gritou: " para com esse berreiro. Eu não surdo não, seu filho da
mãe. Ao que o Fidélis retrucou de pronto: " e nem eu, seu f.d.p....
Foi
a senha para os dois homens se atracarem. Com muito custo, e a intercessão de
Delzir Batista, os dois trabalhadores se acalmaram. O Zé ria a mais não poder.
Tinha feito a sua maldade do dia.
*Urtigão
(desde 1943) é pseudônimo de José Silvério Vasconcelos Miranda, que viveu em
Itaúna nas décadas de 50 e 60. Causo verídico enviado especialmente para o blog
Itaúna Décadas em 23/06/2017.