quarta-feira, janeiro 09, 2019

PEDRA FUNDAMENTAL HOSPITAL

Itaúna 07 Julho 1916


Eis como o “ Minas Geraes”, órgão oficial dos poderes do Estado, notificou as festas do lançamento da pedra fundamental do asylo de caridade “ Cel. Manoel Gonçalves” realizadas nesta cidade a 7 do corrente mez:
“ Conforme já noticiamos, o exmo. Sr. Presidente do Estado foi anteontem à cidade de Itaúna, paranymphar, o acto do lançamento da pedra fundamental do hospital de caridade mandado construir pelo sr. Coronel Manoel Gonçalves de Souza Moreira, antigo comerciante naquela cidade.

O especial partiu desta Capital às 7 horas da manhã, levando na comitiva presidencial as seguintes pessoas : dr. Raul Soares, secretário da Agricultura; dr. Vieira Marques, chefe de polícia; coronel Vieira Christo, ajudante de ordens da presidência; dr. Agostinho Porto, diretor da oeste de Minas; dr. Carvalhães de Paiva, diretor da Imprensa Offcial; marjor Furst, ajudante de ordens da Chefia de Polícia; major Francisco de Castro e suas filhas senhoritas Alzira e luizinha; coronel Manoel Gonçalves de Souza Moreira e sua exma. Esposa; dr. Oswaldo de Araújo, pelo “ Diário de Minas”;coronel Antônio de Mattos, acadêmicos Antônio Moreira, Dario, Augusto, Clarindo e Aldemar Gonçalves, Gines Gea Ribeira e M. Alvim.

Em Soledade do Pará foi servido à comitiva um optimo, “Lunch”. As onze horas da manhã, o especial deu entrada na “gare” de Itaúna, ao som do Hynno Nacional e debaixo de aclamações da grande massa popular àlli estacionada. O exmmo. sr. Presidente do Estado e seus auxiliares foram recebidos pelo sr. Augusto Gonçalves, presidente da Câmara; dr. Alfredo de Albuquerque, juiz municipal do termo; dr. Pedro Nestor, juiz de direito da comarca do Pará, pelos membros do directorio político, autoridades, professores e alunos do grupo escolar.

O sr. Dr. Alfredo de Albuquerque produziu então o discurso seguinte constantemente interrompido por aplausos:

 Exmo. Sr. Dr. Delfim Moreira:
Quando a população de Itaúna foi buscar-me, a mim exclusivamente devotado às cousas de direito, para dirigir a v. exc. As suas saudações de boas vindas, certo pensou que, para a sinceridade da homenagem que entendeu prestar-lhe, poderia servir a voz de quem avesso a lisonjas, tem com tudo um grande culto pela justiça e um espírito capaz de admirar com intensidade.
Aliás, os sentimentos do mandatário não destoam do sentimento dos mandantes.
V. exc. conhece a alma deste povo que, por fortuna sua o tem por guia, num momento difícil da vida nacional. Sabe que os mineiros, gente de virtudes simples, não são thuribularios profissionais.

Reconhecem o mérito e o proclamam com ingênua e ruidosa alegria.
O seu preito é sempre uma sagração.  Bem grande deve ser o orgulho de v. exe., não obstante a modéstia que o caracteriza, ao sentir, nas agruras do poder, nesses ásperos cimos eriçados de tamanhas responsabilidades, o conforto moral que lhe vem dá apoio desinteressado e unanime do povo de Minas Gerais.

As massas humanas, por mais rudimentares que sejam, têm um instíncto que dirige a sua alma e que norteia as suas acções. Esse instíncto, às vezes, pertuba-se ao sopro das paixões rugidoras. Nas épocas de céo lavado é bussola segura.
V. exc. typo representativo desta gente das montanhas, é o seu chefe natural e , por isso mesmo, idolatrado. A confiança no piloto é absoluta. Um passado de esforços patrióticos em prol da terra mineira, justifica essa confiança que se deposita em seu governo por todos os títulos beneméritos.

Nesta ligeira saudação não vem a propósito enumerar o acervo de benefícios que o Estado lhe deve. Alguns deles sagrariam um estadista.
Sempre que Minas o teve em sua administração gosou de paz e na paz  fluiu o espetáculo confortador do trabalho fecundo. Tem appellado com êxito pra o alto espirito de tolerância  que enobrece o caracter  de v. exc. e para a sua clarividência de homem  de estado, todas as vezes em que é preciso amortecer os ódios que a vida política costuma agitar ,todas as vezes em que há necessidade de se organizar e atividade productora.

Foi assim no governo do sr. Dr. Francisco Salles de quem foi v. exc. o braço direito, - governo pacificador, do qual datou uma época radiosa de renascimento em nossa vida econômica. Foi assim, agora quando o voto popular procurou-o como por uma inspiração providencial, para dirigir os nossos destinos  por sobre um mar de incerteza.
Coube-lhe a ventura de terminar a tarefa de confraternização da família mineira, scindida no fragor de luctas ainda memoráveis.

E apesar das dificuldades da hora presente, a aconselharem severas economias – o que v. exc. tem alcançado com uma prudência, com um critério, com uma habilidade realmente admiráveis, - apesar dos tropeços que a situação financeira tem creado à marcha da administração pública, minas caminha, em rota segura, para o brilhante futuro que lhe será reservado.

Ao influxo benéfico de seu governo, as forças vivas se agitam, há um rumor de trabalho e uma doce esperança de grandes dias de fartura e riqueza enche os nossos corações.
Fazer brotar do rochedo de Horeb a lympha crytalina, foi obra milagrosa de Moysés, guia do povo eleito. V.exc.- tirando de uma época de abalos e de desatinos energias creadoras- está realizando milagre semelhante. E isso, com calma modestamente, sem alarde, como essas águas profundas que correm quietas. Ainda agora a sua presença aqui para uma festa de caridade, é um grande estimulo para as iniciativas dos corações generosos.

Exmo. Sr. Dr. Delfim Moreira há de consentir que eu não termine esta saudação sem o relato de uma reminiscência pessoal.
No antigo Theatro Soucasaux, em Bello Horizonte, tive ocasião de assistir a um acto de belleza  empolgante, promovido por italianos, há uns quinze annos atrás.  Era uma solene distribuição de prêmios a alumnos  das escolas mantidas pela colônia. Mas, confesso, sahí acabrunhado daquella festividade, porque Minas amada, por um desolador constraste não curava também da educação de seus filhos.

Estes se entristeciam e se acabrunhavam sob o maldito regimen da férula. Com que santa alegria patriótica dias após, vi no palacete do conde de Santa Marinha, uma festa egual, melhor em enthusiasmo e pompa! Os alunos, porém eram mineiros. Mineiro era o presidente da magna assembleia. Esse presidente era v. exe. – secretário do Interior do governo de então. Póde ser que a memória me engane. Mas guardo a convicção de que foi, como primeiro toque de que foi, como primeiro toque de alvorada, o primeiro passo para o levantamento da nossa instrucção primária.

Outros, muitos outros passos se deram e v. exc. tem sido um dos chefes mais dedicados da santa cruzada, que já nos collocou como modelo, em posição de inconfundível destaque, no seio da federação brasileira.  São poucos os elogios pra os obreiros dessa majestosa construção, sem a qual não é possível a vida das democracias. Bemdicta essa grande preocupação de v.exc. !

Feliz daquelle  que póde receber as aclamações populares com a consciência de que merece por haver cumprido o seu dever !  Viva o dr. Delphim Moreira!
O exmo. Sr. Delphim Moreira agradeceu esta saudação , erguendo vivas ao povo de Itaúna.
Em seguida o especial seguiu até o local onde vae ser construído o hospital , nas proximidades da cidade onde, em um barracão belamente ornamentado, foi servido um lauto almoço.  Ao champagne o sr. Coronel Francisco Santiago, redactor do  “ Itaúna” pela imprensa e pelo directorio político, produziu um bello e eloquente discurso de saudação ao exmo. Sr. Presidente do Estado e cel. Manoel Gonçalves de Souza Moreira pelo seu generoso acto de fazer construir, exclusivamente à sua custa, um importante estabelecimento de caridade.

Em seguida o exmo. Sr. Padre João Ferreira Álvares, vigário de Itaúna, saudou com muita eloquência o sr. dr.  Agostinho Porto, diretor da Oeste. Em nome do sr. coronel Manoel Gonçalves, falou brilhantemente o nosso ilustre collega de imprensa dr. Oswaldo de Araújo. O brinde de honra foi levantado pelo exmo. Sr. Presidente do Estado, aos srs. Dr. Augusto Gonçalves e coronel Manoel Gonçalves.

Depois do almoço, teve logar o lançamento da pedra fundamental. O acto revestiu-se de maior solemnidade, sendo a benção dada pelo revmo. Padre João Álvares. Aquelle digno sacerdote usou da palavra, discorrendo com eloquência sobre a importância do grande melhoramento. Ao povo foi servido então, pelo sr.coronel Manoel Gonçalves, um copo de cerveja.

Depois desta solemnidade, o exmo. Sr. Presidente acompanhado de sua comitiva, das auctoridades  locaes, de grande massa popilar e da banda de música, visitou o prupo escolar e o edifício do fórum. No grupo s. ex. visitou todas as salas, sendo carinhosamente recebido pelos professores e alumnos.

O regresso teve logar às 3 e ½ . Na hora da partida foram erguidos, na estação, enthusiásticos vivas ao exmo. Sr. dr. Delphim Moreira e aos seus auxiliares de governo. O especial chegou a esta capital as 8 horas da noite. O sr. coronel Manoel Gonçalves e sua exma. Esposa foram incansáveis em dispensar gentilezas a todos os convidados.
Ao exmo. Sr. Presidente do Estado foi transmitido pelo dr. José Gonçalves, deputado federal, o seguinte telegramma : Rio, 7 – “ Cumprimento a agradeço honrosa visita  minha terra natal”

- O sr. coronel Manoel Gonçalves ofereceu ao exmo.sr. Presidente do estado a caneta e penna de ouro servidas por s. exe. Na assignatura da acta.
- A casa de caridade cuja pedra fundamental acaba de ser lançada em Itaúna é uma obra de grande vulto e muito recommenda  os sentimentos nobres do sr. coronel Manoel Gonçalves de Souza Moreira. O edifício, composto de dois pavilhões, de bela architectura , terá todas as instalações exigidas pela hygiene e uma sala de operações com os instrumentos cirúrgicos necessários. O digno cavalheiro julga que terá de gastar aproximadamente cem contos na execução da humanitária obra.





REFERÊNCIA:
Fonte: Jornal Cidade de Itaúna, 25 Julho 1916
Local Pesquisa: Instituto Cultural Maria de Castro Nogueira - ICMC
Pesquisa e Organização: Charles Aquino
Texto digitado conforme o original