sábado, julho 20, 2024

TESTAMENTO MANOEL

O testamento de Manoel Gonçalves de Sousa Moreira, redigido em 1920, oferece um vislumbre significativo da vida e dos valores de um empresário que não apenas acumulou riqueza, mas também sentiu uma profunda responsabilidade de retribuir à comunidade que o acolheu.

Este documento não é apenas uma declaração de última vontade, mas um testemunho do compromisso com a caridade, amor pela cidade de Itaúna e sobre os valores e as preocupações de uma figura proeminente da sociedade mineira no início do século XX.

A análise deste testamento permite compreender aspectos importantes de sua vida, suas relações familiares e sociais, bem como a sua visão de filantropia e de preservação de sua memória.

O testamento de Manoel Gonçalves é um documento rico que oferece reflexão sobre seus atos em vida, valores e visão de mundo. Através de suas disposições, é possível perceber um homem preocupado com o bem-estar de sua família, comprometido com a caridade e a ajuda aos necessitados, e atento à preservação de sua memória e legado. A análise crítica deste testamento revela um planejamento cuidadoso e uma visão de longo prazo, refletindo uma vida marcada pela responsabilidade, generosidade e devoção.

“Em nome de Deus, Amém. É este o meu testamento e disposição de minha última vontade. Declaro que sou natural da cidade de Itaúna, Estado de Minas Gerais, comarca da cidade do Pará; que sou filho legítimo de Manoel José de Sousa Moreira e dona Joaquina de Jesus, já falecidos; que sou casado com Maria Gonçalves de Sousa Moreira, não havendo filhos de nosso casal; que os nossos bens se ligam; que por este revogo "in totum" (no todo) o meu testamento anterior a este, aprovado pelo Tabelião Doutor Plínio de Mendonça; e que nada devo a pessoa alguma”.

Manoel Gonçalves de Sousa Moreira inicia o testamento declarando sua origem e estado civil, apontando para a ausência de descendentes diretos. Esta ausência faz com que parte de sua herança seja direcionada à sua esposa, Maria Gonçalves de Sousa Moreira, mais conhecida por Dona Cota, evidenciando a confiança e o desejo de garantir seu conforto e estabilidade após sua morte. A ênfase no usufruto vitalício da residência e de apólices federais sublinha a preocupação em prover uma fonte de renda contínua e segura para Maria, além de uma moradia digna e confortável.

A escolha de distribuir bens significativos para sobrinhos e outros parentes próximos indica uma preocupação com o bem-estar da família extensa, bem como uma tentativa de assegurar que a riqueza familiar permaneça dentro do círculo familiar. A estipulação de que as ações da Companhia Tecidos Santanense não podem ser alienadas até os beneficiários atingirem 30 anos de idade revela uma intenção clara de proteger esses ativos e garantir que os legatários amadureçam antes de terem controle total sobre eles. Este aspecto do testamento demonstra um senso de responsabilidade e uma tentativa de proteger os jovens herdeiros de decisões financeiras imprudentes.

 Disposições Religiosas e Memoriais

As instruções detalhadas sobre a celebração de missas por sua alma, bem como pela alma de seus parentes próximos, mostram a importância da religião e da tradição católica em sua vida. A ênfase nas missas anuais demonstra um desejo de perpetuar a memória e a devoção familiar, reforçando os laços espirituais e comunitários.

“Declaro que o meu testamenteiro ou testamenteira, mandará celebrar cinquenta missas por minha alma, além da do sétimo, trigésimo e quinquagésimo dia do meu falecimento, dez por alma de meus parentes, dez por alma de minha mulher, dez por alma de meus pais; que a administração da Casa de Caridade mandará celebrar anualmente, enquanto ela existir, oito missas, sendo duas por minha alma, duas por alma de minha mulher, duas por alma de meu pai e duas por alma de minha mãe”.

A construção de um mausoléu de mármore e a preocupação com a sua conservação destacam um desejo claro de garantir que sua memória seja preservada de forma digna e respeitosa — “Deixo oito contos de réis para se erigir um mausoléu de mármore em meu jazigo perpétuo, ficando a sua conservação, zelo e limpeza a cargo da administração da "Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Sousa Moreira", que o conservará sempre limpo e bem cuidado”. Esta disposição é um reflexo do status social e da importância atribuída à aparência e à manutenção de um legado visível e respeitado.


 Testamenteiros e Cumprimento das Disposições

A nomeação de múltiplos testamenteiros, incluindo sua esposa, afilhado e irmãos, com uma clara ordem de sucessão, demonstra uma abordagem meticulosa e organizada. A promessa de recompensa na forma de ações da Companhia Tecidos Santanense para o testamenteiro que cumprir todas as disposições no prazo estipulado revela um entendimento do valor do trabalho e do esforço necessários para administrar um testamento complexo como este. A escolha de testamenteiros próximos e confiáveis indica a confiança de Manoel em sua capacidade de executar suas últimas vontades de forma eficiente e fiel.

 Filantropia e Legado Duradouro

 Uma das partes mais significativas do testamento é a criação da Casa de Caridade "Manoel Gonçalves de Sousa Moreira". A instituição desta casa reflete não apenas a generosidade e a preocupação de Manoel com os desfavorecidos, mas também a sua intenção de deixar um legado duradouro para a comunidade de Itaúna. A construção da casa em terreno comprado por ele e a garantia de fundos para sua manutenção através de apólices e ações mostram um planejamento cuidadoso e uma visão de longo prazo.

Manoel também especifica que a administração da Casa de Caridade pode ser realizada pela Câmara Municipal de Itaúna ou, na ausência desta, pela diretoria da Companhia Tecidos Santanense. Esta escolha revela um entendimento pragmático das estruturas de poder e uma tentativa de garantir que a instituição seja bem administrada, independentemente das circunstâncias.

O aspecto mais notável do testamento de Manoel é a sua decisão de deixar a maior parte de sua fortuna para a construção da Casa de Caridade "Manoel Gonçalves de Sousa Moreira" — 

“Instituo a Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Sousa Moreira, herdeira do remanescente de todos os meus bens, valores e haveres, deduzida a importância de todos os legados, de todas as minhas disposições e despesas de funeral que será de primeira classe”.

Este ato de generosidade não apenas reflete sua preocupação com os necessitados, mas também sua intenção de criar um legado duradouro que perpetuasse seu nome e suas ações benevolentes na comunidade de Itaúna.

A criação da Casa de Caridade é um marco significativo. Manoel não apenas destinou fundos substanciais para sua construção, mas também garantiu a manutenção da instituição através de apólices federais e estaduais, além de ações da Companhia Industrial Belo Horizonte e da Companhia Tecidos Santanense. Ele cuidadosamente planejou para que a casa de caridade fosse sustentada pelos juros e dividendos desses investimentos, assegurando sua viabilidade financeira a longo prazo.

 Compromisso com a Comunidade

Manoel demonstrou um profundo amor pela cidade de Itaúna e um compromisso inabalável em melhorar a vida de seus habitantes. Ao especificar que a administração da Casa de Caridade fosse conduzida pela Câmara Municipal de Itaúna, ou na falta desta, pela diretoria da Companhia Tecidos Santanense, ele mostrou uma compreensão clara das dinâmicas locais e garantiu que a instituição seria bem gerida. Esta escolha de administração também evidencia sua confiança nas instituições locais e sua crença na capacidade delas de perpetuar sua visão filantrópica.

O testamento de Manoel Gonçalves de Sousa Moreira revela um empresário que, além de acumular riqueza, dedicou-se a usar seus recursos para o bem-estar de sua comunidade. Seu ato de deixar a maior parte de sua fortuna para a construção da Casa de Caridade "Manoel Gonçalves de Sousa Moreira" não é apenas um exemplo de filantropia, mas um símbolo de seu amor e compromisso com Itaúna. Através deste gesto, Manoel não apenas garantiu que sua memória fosse perpetuada, mas também que sua cidade natal continuasse a prosperar e a cuidar dos seus necessitados. Este testamento é um tributo duradouro à generosidade e à visão de um homem cuja influência positiva será sentida por muitas gerações.

História narrada em áudio! Imperdível!

TESTAMENTO 1º PARTE

TESTAMENTO 2ª PARTE


Arte, pesquisa e roteiro: Historiador Charles Aquino ...

Fonte: Enciclopédia Ilustrada de Pesquisa: Itaúna em Detalhes...

Fascículo número 37, Ano 2003.

Acervo: Instituto Cultural Maria de Castro e Itaúna Décadas 

 

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