segunda-feira, novembro 18, 2024

NOS CONFINS DA MEMÓRIA

Mary caminhava sozinha pela estrada deserta, o som de seus passos ecoando nas ruas vazias. A noite estava calma, mas algo em seu interior a inquietava. Ela sentia que havia algo a ser desvendado, algo a ser encontrado. Ouvia vozes que a chamavam para além do alcance da luz da cidade, vozes que a conduziam para o desconhecido. Não era apenas a curiosidade que a motivava, mas um pressentimento de que algo importante estava prestes a acontecer.

Ao longe, ela avistou a entrada da floresta. As árvores, altas e imponentes, formavam uma cortina de sombras densas que escondiam os mistérios por trás delas. Mary sabia que não devia entrar, mas seus pés a conduziram, e as vozes insistiam para que ela entrasse: "Venha, Mary", diziam as vozes. Ela estava com medo, mas continuou caminhando.

Quando entrou na floresta, o silêncio tomou conta de seu ser. Era um silêncio pesado, que parecia pesar sobre seus ombros e penetrar seus ouvidos como um pano escuro. Ela sentiu o ar fresco da noite, carregado de odores terrosos e de algo inusitado que não sabia definir. A vegetação ao redor estava densa, mas o caminho à frente parecia aberto, como se estivesse sendo preparado para ela, um convite sutil para seguir em frente.

Ela deu o primeiro passo, depois outro, e logo percebeu que estava imersa na escuridão suave da floresta. Cada folha farfalhava com o vento, mas, no fundo, ela sabia que não estava sozinha. De repente, as vozes voltaram, e a cada passo que ela dava ficavam ainda mais altas. Algo a observava, algo que parecia conhecê-la mais do que ela mesma. Assustada, Mary olhou para frente.

Uma figura apareceu diante dela. Era uma presença inconfundível, misteriosa e intensa, com olhos que brilhavam como estrelas na noite. Ela não sabia o que era, mas sentiu uma força indescritível emanando daquela figura, e percebeu que as vozes vinham dela.

A figura falou com uma voz suave, mas firme:

— Você chegou, Mary. Eu sabia que viria. O que a trouxe até aqui?

Embora assustada, Mary não conseguiu recuar. Algo dentro dela dizia que precisava ficar. Havia uma urgência em sua alma que a impedia de ir embora.

— Eu... não sei exatamente — disse Mary, a voz tremendo levemente. — Algo me trouxe aqui. Algo que não consigo explicar.

A figura sorriu levemente, mas seus olhos permaneciam fixos, como se observassem todos os detalhes da alma de Mary.

— Você pensa que não sabe, mas sempre soube. Cada passo que deu até aqui foi guiado por algo que você não entende. Já se perguntou por que a vida parece sempre desviar-se para este ponto? Está à procura de respostas, não está?

Mary engoliu em seco. As palavras da figura eram como flechas acertando seu coração, atingindo pontos vulneráveis. Ela sempre buscou respostas sobre sua própria vida, sobre a perda de seu pai, Gael, e as questões que envolviam sua mãe, Estela. Sentia que algo estava escondido delas, algo que nunca havia sido dito, algo que ainda precisava ser revelado.

— O que você sabe sobre mim? — Mary perguntou, a voz quase inaudível.

A figura não respondeu de imediato. Apenas olhou profundamente nos olhos de Mary, como se lesse cada pensamento, cada emoção. Então, falou quase num sussurro:

— Sei o que você guarda dentro de si. Vejo o que não diz, o que esconde até de si mesma. Pensa em seu pai, Gael, com tanta saudade... Sente a falta dele todos os dias, não é? Mas há algo mais, Mary. Você carrega a dor da perda, o peso da ausência. Cada vez que fecha os olhos, ainda sente a presença dele, mas como se fosse uma ilusão. E sua mãe, Estela... você a observa, tentando entender os segredos que ela guarda. Ela é forte, mas você sente que há algo que nunca compartilhou. Algo do passado, que a consome e a afasta de você. E você quer saber o que é, não quer? Quer respostas, mas quanto mais busca, mais se perde.

Mary sentiu um frio percorrer sua espinha. Era impossível negar o que a figura dizia. Cada palavra atingia seus sentimentos mais profundos, suas inseguranças, seus medos.

— Como sabe disso? — Mary perguntou, agora sentindo um calafrio mais forte. — Como sabe tudo isso sobre mim?

A figura sorriu, a expressão mais enigmática.

— Não preciso de respostas, Mary. Vejo tudo. Vejo o que você não consegue ver, o que está oculto dentro de você. Sou as árvores, o vento, o chão sob seus pés. Sou a memória das coisas que foram perdidas, das coisas que deixou de lado.

Mary sentiu a pressão aumentar. O medo tomava conta dela, mas algo dentro dela parecia despertar. Sabia que não podia permitir que aquela figura invadisse ainda mais sua mente. Precisava ser forte.

Respirou fundo e, com firmeza, disse:

— Saia da minha cabeça! Não aceito que vasculhe minha mente! Eu sou a dona dos meus pensamentos! Você não tem acesso a mim! Saia agora!

Os olhos da figura se estreitaram, cheios de uma fúria silenciosa. O ar ao redor de Mary parecia vibrar com a intensidade de suas palavras, como se a própria floresta reagisse à sua determinação. As vozes vindas da floresta aumentaram, agora parecendo um apoio à sua coragem.

— Continue, Mary! — diziam as vozes. — Continue assim!

Mary não hesitou. Deu um passo à frente e, com um grito firme, disse:

— Saia agora! Acha que tenho medo de você? Não tenho! Só sei que você está nos meus pensamentos, e meus pensamentos quem controla sou eu. Eu te expulso agora!

A figura, antes tão poderosa, começou a recuar. Seus olhos estavam cheios de surpresa e fúria, mas, conforme Mary continuava a gritar, sua silhueta começou a se desfazer, como se estivesse perdendo a força que a sustentava, sendo empurrada para longe pela mente de Mary.

Com um último grito, a figura desapareceu completamente, deixando Mary sozinha na floresta. O silêncio tomou conta novamente, mas desta vez era acolhedor, como se a floresta permitisse que ela se restabelecesse.

Mary ficou ali por um momento, respirando pesadamente. Sentia a presença da figura desaparecer, mas também sentia que algo dentro dela havia mudado. Uma sensação de clareza, de liberdade, tomou conta de seu ser. Olhou ao redor e viu que o caminho à sua frente estava mais claro. As árvores pareciam afastar-se, dando-lhe passagem. Era como se a floresta estivesse esperando por ela para tomar a próxima decisão.

Mary começou a caminhar, os passos agora mais firmes. Sabia que sua jornada não havia terminado. Estava pronta para descobrir mais, para enfrentar o que fosse necessário e, talvez, finalmente encontrar as respostas que tanto procurava.

A história termina aqui, mas a jornada de Mary continua. A floresta tem muitos segredos a revelar, e Mary está pronta para desvendar cada um deles.


"Escritoras Contemporâneas"

História e direção narrativa: Josyane Mara

Arte e design: Charles Aquino

Ilustração criada com IA, inspirada no conteúdo do texto.