Afrescos de Sant’Ana na Velha Matriz
A história da antiga Matriz de Sant’Ana de Itaúna está profundamente ligada ao desenvolvimento religioso, social e artístico da cidade. Originalmente fundada como Capela do Rosário em 1840, foi edificada com o esforço dos pretos em suas horas de folga, testemunhando a devoção e a resiliência da comunidade local.
Em 1853, ocorreu a permuta das capelas, e o templo foi elevado à condição de matriz, mantendo-se como um marco religioso até os dias atuais. Sob a supervisão do padre Antônio Domingues Maia, a matriz passou por sucessivas ampliações e transformações ao longo de quase um século, até ser demolida em 1934, para dar lugar a uma nova edificação, mais condizente com o crescimento e as demandas da cidade em constante transformação.
A Matriz original, concluída em 1875, era uma construção simples em sua aparência exterior, mas seu interior surpreendia pela riqueza das pinturas e elementos decorativos. Pedro Campos, de Sabará, auxiliado por Antônio José dos Santos (Tonho do Bá), realizou as primeiras pinturas internas, embora sua qualidade tenha sido considerada medíocre. Os reparos realizados em 1916 e 1926 acabaram eliminando grande parte dessa obra inicial.
O edifício, contudo, era marcado não apenas por suas belezas artísticas, mas também por tragédias. Durante as obras de ampliação em 1857, o carpinteiro João Júlio César Silvino perdeu a vida ao cair da cobertura. Em homenagem ao seu trabalho, foi o primeiro sepultado no interior da igreja.
Entre os afrescos, destacavam-se representações bíblicas, como a degolação dos inocentes, a fuga para o Egito e o casamento de Nossa Senhora. A qualidade de algumas dessas obras chamou a atenção, especialmente pela similaridade da tonalidade azul utilizada com a técnica do renomado Mestre Ataíde. Em 1917, o pintor Otávio Vítor, ao restaurar a igreja, decidiu preservar uma dessas telas, acreditando tratar-se de uma obra excepcional, mesmo sem conhecer seu autor.
Mais tarde, foi revelado que uma das pinturas — o casamento de Nossa Senhora com São José — era uma réplica de uma obra de Rafael, originalmente pintada para a Igreja de São Francisco em Città di Castello, em 1504. Essa descoberta reforça a influência do Renascimento italiano no imaginário religioso local e no repertório artístico da época.
Entre os elementos icônicos da Matriz estava o galo de lata, instalado em uma das torres. De significado litúrgico, o galo era objeto de superstição: acreditava-se que, se apontasse seu bico para o cemitério devido ao vento, grandes tragédias e mortes ocorreriam na cidade.
Os sinos e o relógio da torre foram adquiridos graças a uma subscrição pública liderada por João Antônio da Fonseca, um grande benemérito da igreja. Esses objetos testemunhavam o esforço comunitário em torno da construção e manutenção do espaço religioso.
A demolição da Matriz em 1934, conduzida pelo padre Ignácio Campos, marcou o fim de um ciclo histórico e o início de uma nova era para Itaúna. Embora a igreja antiga não tenha sobrevivido, seu legado persiste na memória coletiva, nas histórias sobre seus afrescos e nos elementos preservados, como a estampa do casamento de Nossa Senhora encontrada no Lar Católico.
A velha Matriz de Sant’Ana, apesar de simples por fora, era um verdadeiro repositório de história, fé e arte, representando o desenvolvimento espiritual e cultural de Itaúna no século XIX e início do século XX.
"Numa das torres da velha matriz
existia um galo de lata, de significação litúrgica. Se caso esse galo, por
efeito do vento, voltava o bico para o lado do cemitério, grandes mortandades se
verificavam na cidade" ... (DORNAS,
pág. 99). "Os sinos e relógio da torre foram adquiridos por subscrição pública, iniciada por um grande benemérito de Sant’Anna — João Antônio da Fonseca" ... (DORNAS, pág. 24).
"A ampliação da matriz custou a vida de João Júlio Cesar Silvino, carpinteiro, que trabalhava nas obras de cobertura, em 1857, e que precipitara ao solo. No Livro de óbitos nº 1 consta o lançamento do seu enterramento no interior da igreja, em homenagem ao fato de trabalhar nas obras, parecendo ser o primeiro sepultado ali" (DORNAS, pág. 24).
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"Só em 1875 é que terminaram as obras
com a pintura interna feita pelo artista Pedro Campos, de Sabará, auxiliado por
Antônio José dos Santos (Tonho do Bá, como o chamavam). Era uma pintura medíocre, que os consertos de
1916 e 1926 fizeram desaparecer" (DORNAS,
pág. 24).
"Era uma igreja de linhas simples por
fora, não tendo nada de arte. Simples por fora, mas pomposa por dentro; era bem
pintada, com lindas telas, tinha no teto anjinhos e medalhões nas paredes do
lado direito do altar-mor era a tela da degolação dos inocentes, a fuga para o
Egito e, do lado esquerdo, o casamento de Nossa Senhora" ... (Sousa, pág.37).
"No ano de 1917, quando o pintor
Otávio Vítor (o Otavinho) restaurou a pintura da igreja, não quis tocar nem de
leve na tela, por se tratar de obra de arte de algum pintor famoso como mestre
Ataíde. Ele ignorava quem havia pintado um azul tão parecido como o desse
mestre. Só ele sabia misturar aquela cor, só ele conhecia o segredo" (Sousa, pág.37).
"Passados muitos anos da demolição da velha
Matriz, encontrei no Lar Católico a estampa do casamento de Nossa Senhora com
São José. O quadro é o mesmo da pintura de nossa igreja. É de *Rafael e foi
pintado para a igreja de São Francisco em Cittá di Castello no ano de 1504" (Sousa, pág.38).
*Raffaello Sanzio
Saiba mais em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Rafael
As colinas vão ser abaixadas / Memórias Sonoras e Afetivas
Organização, Pesquisa e Arte: Charles
Aquino
TEXTOS DE: João Dornas Filho e Iracema Fernandes de Sousa.
TEXTOS DE: João Dornas Filho e Iracema Fernandes de Sousa.
FILHO, João Dornas.
Itaúna: Contribuição para a história
do município, 1936, págs. 22-24,99.
SOUSA, Iracema Fernandes de.
Itaúna através dos tempos, Ed. LEMI S.A., BH, 1984, págs. 37-38.
Fotografias meramente ilustrativas disponíveis em : Anjos& Medalhões, Casamento da Virgem, Massacre dos Inocentes e Fuga para oEgito.
Acervo: Charles Aquino, Paróquia Sant'Anna de Itaúna.
Family
Search disponível em:
"Brasil, Minas Gerais, Registros da
Igreja Católica, 1706-1999," database with images, FamilySearch (https://familysearch.org/ark:/61903/3:1:939N-D791-R9?cc=2177275&wc=M5FD-2NP%3A370882003%2C369941902%2C370938801: 22 May 2014), Itaúna > Santana >
Óbitos 1840, Jan-1888, Fev > image 78 of 92; Paróquias Católicas (Catholic
Church parishes), Minas Gerais.