Nunca
soube o seu nome de família. Todos que o conheciam tratavam-no pelo prenome e o
apelido Onofre"Bacalhau”. Alcunha óbvia, era magro, quase transparente. Em
chuva de pingos grossos era capaz de caminhar entre eles sem se molhar. Tinha
outra característica ímpar. Tinha o estopim muito curto. Aliás, nem tinha:
explodia por qualquer motivo.
Proprietário
de um barzinho numa rua que começava numa pracinha em frente a antiga venda do
Serafim (rua Silva Jardim), descia e depois subia, atravessando o Córrego
da Praia. O botequim era ao lado da casa do Tiaca, uma ótima figura, casado com
Luzia Narcisa. Raça boa de gente do Calambau.
Vou
narrar três histórias curtas do Onofre, duas presenciadas por mim. A terceira,
marcou época na cidade.
PRIMEIRA
HISTÓRIA: CIGARRO PICADO
Estávamos
no boteco tomando cachaça e cerveja. O Bacalhau, além de dono, também
participava. A roda estava animada e Onofre não queria ser aborrecido por
fregueses. Foi aí que entrou um cliente e indagou: "Onofre, tem cigarro
picado?
Resposta
do Bacalhau: " só maço fechado. Se quiser, tem Continental, Beverly e
Lincoln". O freguês insistiu: será que não dá pra abrir um maço e me
vender três cigarros? Já nervoso, Onofre
respondeu: " não dá não e não insista"!!!
Teimoso
o comprador insistiu. " Só três Beverly, não quero comprar muito. Estou
tentando largar o vício".
De
imediato, Bacalhau levantou-se da mesa, abriu um maço, apanhou três cigarros,
pegou uma faca bem grande e picou os três, bem miúdos no balcão. Ato contínuo,
apanhou a " maçaroca" e colocou tudo no bolso da camisa do insistente
e disse raivoso: " toma o cigarro picado. E nem precisa pagar"!!!
SEGUNDA
HISTÓRIA: TRÊS GARRAFAS
A
segunda história, também passada no botequim, aconteceu com o caminhão de
cerveja. Naqueles tempos, não existiam cervejas em lata e tampouco as
embalagens descartáveis. Para comprar a bebida, o dono do bar tinha de entregar
engradados e garrafas vazias, para repor o vasilhame cheio.
Onofre
pediu quatro engradados. O entregador contou o vasilhame e deu falta de três
garrafas. Argumentou que em tal hipótese, só podia entregar três engradados. O
comerciante argumentou que era freguês conhecido e reporia as garrafas
faltantes na próxima compra. O entregador não cedeu.
Na
terceira tentativa infrutífera, Bacalhau pegou o vendedor de cerveja pelos
ombros e o assentou em uma cadeira, dizendo em seguida: " já que não pode ser assim e eu não
posso ficar sem a bebida, fica assentado aí e espere. Em seguida me chamou para
compartilhar a cerveja. Vamos beber três garrafas.
Quando terminarmos, o engradado estará
completo. Assim foi dito e assim foi feito. Bebemos calmamente, apreciando cada
gole.
TERCEIRA
HISTÓRIA: COMPRIMIDO RUA ABAIXO
A
terceira história aconteceu na Farmácia Nogueira. Onofre chegou no balcão e
pediu uma aspirina. Estava com uma dor de cabeça terrível. O caixeiro, novo no
estabelecimento, pegou o comprimido, deu o preço e indagou solicito: " o
senhor quer que eu embrulhe? Resposta imediata do Bacalhau: " não precisa.
Eu vou rodando o comprimido rua abaixo" !!!
Aí
vão três historinhas. Duas são verídicos. Eu presenciei. A terceira, faz parte
do folclore da cidade.
*Urtigão
(desde 1943) é pseudônimo de José Silvério Vasconcelos Miranda, que viveu em
Itaúna nas décadas de 50 e 60. Causo verídico enviado especialmente para o blog
Itaúna Décadas em 20/08/2017.
Acervo: Shorpy