"Hoje seria mais um, ou menos um dia em nossas vidas?"—tal indagação, revestida de aparente simplicidade, encerra uma profunda inquietude acerca da própria existência.
Ao questionar se cada dia transcorrido representa uma soma ou uma subtração em nossa trajetória, a frase lança-nos em um labirinto de reflexões sobre a temporalidade, a finitude e o valor que atribuímos ao decurso das horas.
A resposta, contudo, não se encontra na matemática impassível dos calendários, mas na maneira como optamos por habitar o presente.
Sob a ótica da vida como acréscimo, cada dia se revela como uma oportunidade singular: um novo ensejo para aprender, amar, criar ou transformar.
Nesta perspectiva, o tempo desponta como um aliado generoso, um solo fértil onde semeamos memórias e colhemos experiências. A cada alvorecer, somos presenteados com a consciência de estarmos vivos, celebrando a existência como uma jornada de expansão, em que cada instante se converte em semente do porvir.
Em contrapartida, se concebermos a vida como uma subtração, cada dia constitui um degrau a menos na ascensão rumo ao inexorável final. Nesse cenário, a morte transforma o tempo em uma ampulheta implacável, e cada grão de areia que se esvai reitera a efemeridade de todas as coisas.
Ainda que essa visão se apresente carregada de uma
melancolia sombria, ela não precisa semear o desespero; pelo contrário, pode
instigar-nos a viver com um propósito, recordando as palavras de Sêneca:
"Não é que temos pouco tempo, mas que desperdiçamos muito." Aqui, o
"menos um" emerge não como derrota, mas como um alerta para que não
deixemos os dias escaparem desprovidos de significado.
A dualidade entre "mais um" e "menos um" evidencia, pois, que o tempo transcende sua mera quantificação objetiva, constituindo uma experiência eminentemente subjetiva. Para Henri Bergson, o tempo cronológico—rigorosamente medido pelos relógios—distingue-se radicalmente do tempo vivido, a chamada duração, que se modula conforme a intensidade e o peso emocional de cada momento.
Assim,
um único dia pode revelar-se uma eternidade quando permeado pela paixão, pela
dor ou pela descoberta, ou dissipar-se como um breve sopro se atravessado pela
indiferença. Dessa forma, a indagação inicial desdobra-se: o que importa não é
a contagem dos dias, mas a forma como os tornamos dignos de serem lembrados.
No âmago desta reflexão está o "hoje", termo que ancorou a pergunta e sublinha a urgência do presente. O pretérito já se converteu em história, o futuro se apresenta como uma promessa incerta, mas o presente é o único território onde a vida se desvela em sua plenitude.
É nele que decidimos se este dia se
transmutará em "mais um" na rotina da repetição, em "menos
um" na contagem regressiva da ansiedade, ou se, quiçá, transcenderá a
lógica numérica, assumindo a singularidade de um instante inefável. Conforme preconizava
o existencialismo, o sentido não está predeterminado: somos nós os artífices do
significado por meio das escolhas que fazemos no agora.
Em última análise, a pergunta não demanda uma resposta definitiva, mas um posicionamento existencial. Ela convoca-nos a renunciar à ilusão de domínio sobre o tempo e a abraçar a ambiguidade inerente à existência.
Se um dia é ganho ou perdido, tal
veredicto depende menos do destino e mais da profundidade com que o
vivenciamos. Como asseverou Fernando Pessoa, "tudo vale a pena se a alma
não é pequena." Assim, a verdadeira medida de um dia talvez não resida na
aritmética das adições e subtrações, mas na audácia de transmutá-lo em algo que
desafie qualquer quantificação—um instante, por ter sido vivido em sua
totalidade, que se eterniza no tempo."
Lótus Negra
Arte e design: Charles
Aquino
Ilustração criada
com IA, inspirada no conteúdo do texto.