quarta-feira, junho 26, 2024

POVOADO DOS COELHOS

Era inverno do mês de agosto, nas barrancas de Santana do Rio São João Acima, hoje Itaúna, e a região dos Coelhos estava em um "rebuliço só".  Farofa, um senhor magro, forte e de uma fé inabalável, era conhecido por seu estilo impecável: roupas sociais sempre bem engomadas, um verdadeiro brinco! Mas a tranquilidade da fazenda foi perturbada por uma história que se espalhava como fogo em palha seca.

Os moradores da região dos Coelhos juravam que tinham visto vultos misteriosos à noite: quatro homens de terno carregando um caixão. Essa aparição macabra acontecia duas a três vezes por semana, deixando todos apavorados. Farofa, no entanto, não se intimidava com essas histórias de fantasmas e decidiu que desvendaria o mistério. — Essa semana estarei de vigia todas as noites! — declarou Farofa com firmeza, desconsiderando os conselhos temerosos dos vizinhos.

Com seu fiel cachorro Caramelo e uma mochila cheia de comida, Farofa foi para o mato adentro da fazenda. Nas primeiras duas noites, a única coisa que ele ouviu foram os sons dos sapos, pererecas e grilos. Mas na terceira noite, ao pé do morro, ele avistou algo que fez seu coração pular uma batida.

— Será que são eles? — murmurou Farofa, esfregando os olhos para ter certeza do que via. Quatro homens de terno, carregando um caixão, vinham em sua direção. Pela primeira vez, Farofa sentiu um frio na espinha. Seria a morte enviando seus emissários para levar alguém da fazenda? Ele se manteve paralisado, observando a cena. De repente, um dos homens tropeçou e soltou um pavoroso palavrão.

 Diacho! Esses fantasmas estão é “muito pecadores”, falando desse jeito! — pensou Farofa, agora mais confuso do que assustado. O fiel e atento Caramelo percebendo que havia algo errado, avançou no grupo. Um dos homens, apavorado, saiu correndo mato adentro, desestabilizando os outros. Em um instante, todos largaram o caixão e correram para salvar suas peles. Farofa, ainda meio atordoado, deixou o cachorro perseguir os homens e se aproximou do caixão. Ao abri-lo, o que viu o deixou boquiaberto.

— Misericórdia! — Misericórdia! Cambada de safados! — gritou Farofa. Em vez de um corpo, o caixão ... era café! Isso mesmo! O caixão tinha uma alma se quer — estava cheio de grãos de café. Farofa descobriu que os supostos “fantasmas” eram, na verdade, ladrões roubando o café da fazenda.

O alvoroço na fazenda rapidamente se transformou em risos e piadas sobre os "fantasmas pecadores". E Farofa, o homem de muita fé que não tinha medo de nada, tornou-se ainda mais respeitado, agora não apenas por sua coragem, mas também por seu inusitado senso de humor diante do inexplicável.

E assim, na pequena comunidade da região dos Coelhos, essa história tornou-se lendária. Até hoje, os moradores mais antigos lembram dos passos dos homens de terno e do vulto do caixão, mesmo que toda a história tenha sido esclarecida. Entre risos e recordações, a verdade se mistura com a lenda, perpetuando o causo do caixão cheio de café como uma prova de que, às vezes, a realidade pode ser mais cômica e surpreendente do que qualquer mera imaginação.

Opaaaa!! ... esperaí !! ... pensaram que iria esquecer do corajoso e fiel Caramelo?  Pois bem ... Caramelo depois de espantar os ladrões, se tornou também um respeitável herói e mais querido ainda pelos moradores dos Coelhos... 

Veja o "Causo" narrado em áudio! Imperdível !


Referências:

Arte, organização:  Barranqueiro — Charles Aquino

Causo: Barranqueiro Borges