Em
1973, idealizada pelo escritor David de Carvalho, a programação cultural desta
semana festiva foi dedicada à memória de João Guimarães Rosa, que de lá saíra
há quarenta anos, mas prometendo se conservar “itaguaro-itaunense” de coração,
para sempre.
Eu fora convidada a participar, fazendo uma
conferência sobre a obra e a personalidade de meu pai. Desde o momento em que o comitê de recepção
nos recebeu à porta da cidade, com ramos de flores e aplausos, Peter e eu nos
sentimos itaunenses também, e vivemos dias maravilhosos, ambiente de grande
carinho.
Tudo perfeito. A gentil hospitalidade da
família Guaracy de Castro Nogueira, na sua bela mansão às margens da barreira
de Benfica. Dona Ivete mandara enfeitar de rosas desde a entrada até a suíte que
ocupamos. Garçons enluvados serviram-nos gostosos pratos típicos mineiros.
Amigos antigos, que me haviam visto pela última vez quando eu tinha apenas dois
anos, foram, pressurosos, me beijar. Estudantes nos entrevistando, gravadores
ligados, fotografias, conversas e risos, amizade, curiosidade e uma emoção.
De parabéns a comissão organizadora,
constituída pelo próprio David de Carvalho, José Waldemar Teixeira de Melo,
chefe de gabinete do prefeito Hidelbrando Canabrava Rodrigues, os professores
Marco Elísio Chaves Coutinho, Francisco De Filippo, José Gomes Miranda,
Jefferson Ribeiro de Andrade, diretor da revista literária bel’Contos, e a
jornalista e escritora Carmem Schneider Guimarães, casada com o primo de papai,
José Luiz Gonçalves, que é advogado e professor. Carmita, como a chamamos na
intimidade, é conhecedora entusiasta da obra de meu pai, e muito a tem
divulgado, em Minas, com excelentes artigos.
A programação começou inaugurando o minimuseu
Guimarães Rosa, com livros, algumas cartas, fotografias e objetos-lembranças. O
seu retrato foi descerrado. Professores fizeram conferências diárias sobre a
sua obra, e também falou o tio Vicente Guimarães, que estava com tia Miretta.
Ele lançou então o livro infantil Joãozito, Infância de Guimarães Rosa,
autografando-o para os alunos de vários grupos escolares da cidade.
O reitor Guaracy de Castro Nogueira e o
diretor da Faculdade de Filosofia, professor Antônio de Oliveira, receberam-nos
com muita simpatia. E, para um auditório lotado de alunos, professores e
convidados, fiz a conferência de encerramento.
Antes, uma bonita missa celebrada pelo padre que havia sido porteiro do
Colégio Arnaldo, onde Joãozito
estudara, em Belo Horizonte. E à saída da igreja, uma alegre surpresa: a banda
de música de Itaguara – e como papai apreciava uma bandinha ...
Um dos músicos, velhinho simpático de úmidos
olhos verdes, se adiantou, me abraçando: Seu pai, o querido dr. Rosa, salvou a
vida de meu filho! Foi um dos melhores momentos ouvir esta frase feliz de um
homem cuja gratidão ainda persistia muito forte após quarenta anos. O enorme sucesso dessa promoção, cultural, a
beleza da homenagem, a bondade do povo de Itaúna, permanecerão entre as minhas
lembranças mais gratas e queridas.
Vilma Guimarães Rosa
FONTE:
ROSA, VILMA GUIMARÃES. Relembramentos: João Guimarçaes Rosa, Meu Pai. Ed. Nova
Fronteira S.A., 2008. p.410-411.