segunda-feira, maio 13, 2024

DESASTRE FERROVIÁRIO

Um trem da RMV — Rede Mineira de Viação — descarrilou entre as estações de Angicos e Santanense, resultando na morte de oito pessoas e deixando mais de cinquenta feridos. O acidente ocorreu devido ao excesso de velocidade, com três vagões descarrilados. O maquinista fugiu após o ocorrido. O resgate dos corpos durou doze horas, com algumas vítimas presas entre as ferragens. A maioria dos passageiros estava a caminho de assistir a um jogo de futebol em Itaúna. Parentes das vítimas acenderam fogueiras nas proximidades enquanto aguardavam o reconhecimento dos corpos. A RMV atribuiu a principal causa do acidente à inadaptação dos velhos carros ao novo traçado da linha.

O desastre aconteceu quando o trem entrou em alta velocidade numa curva. O acesso ao local era difícil, o que complicou os esforços de resgate. O pânico se espalhou entre os passageiros após o descarrilamento, com muitos tentando fugir. Oito pessoas foram identificadas como mortas, incluindo funcionários da RMV, um gerente de banco e um jogador de futebol juvenil. Alguns passageiros deixaram familiares, incluindo crianças órfãs. Os feridos foram levados para o hospital de Itaúna, incluindo um menino chamado Gerson, cujos pais não foram encontrados.

O prefeito de Carmo do Cajurú prestou homenagem a um amigo falecido, enquanto uma mulher que estava no trem foi recebida pelo marido na estação com o corpo da esposa. Um conferente da RMV e um jovem jogador de futebol estavam entre os mortos. Um relatório sobre as causas do desastre foi preparado, mas não divulgado. O fiscal que estava no trem escapou ileso e planeja relatar o incidente à direção da empresa.

*Nota: Este resumo é baseado no texto original do trágico acidente, onde os leitores podem verificar com mais detalhes a reportagem feita na época.

BELO HORIZONTE, 21 (UH) — Oito pessoas morreram, e mais de cinquenta ficaram feridas, no desastre ocorrido na tarde de domingo, entre as estações de Angicos e Santanense, quando o trem elétrico da RMV — Rede Mineira de Viação — de prefixo PB-3, que saiu de Divinópolis às 13:30h com destino a Belo Horizonte, teve três vagões descarrilados, por excesso de velocidade. O maquinista, L.H. fugiu, ao flagrante.

Só na madrugada de ontem — doze horas depois do desastre — a turma do socorro conseguiu retirar os cadáveres que estavam imprensados entre as ferragens. Um casal morreu abraçado, deixando órfãos um menino de quatro anos e uma menina de dois. Uma criança, de 4 anos, está internada no Hospital de Itaúna, mas não sabe dizer os nomes de seus pais que estavam no trem PB-3. Algumas enfermeiras já querem criá-lo, caso seus pais não apareçam.

A maioria dos passageiros ia de Divinópolis para Itaúna, assistir ao jogo de futebol do Guarani contra o campeão da 1ª Divisão. Enquanto esperavam o guindaste suspender o vagão onde estavam imprensados os mortos, parentes das vítimas acendiam fogueiras nas proximidades, aguardando o momento do reconhecimento dos corpos. A direção da RMV — Rede Mineira de Viação — diz que a causa principal do desastre é a inadaptação dos velhos carros ao novo traçado da linha.

O DESASTRE — O desastre ocorreu às 14:20h, quando um trem elétrico, de prefixo PB-3, entrou em alta velocidade numa curva disfarçada. Pessoas que viajavam no elétrico afirmam que, desde a estação de Divinópolis, o trem PB-3 estava em alta velocidade. O local é de difícil acesso, pois não possui estrada de rodagem, o que prejudicou muito a ida da turma de socorro. Depois do descarrilamento do primeiro vagão, o pânico se estabeleceu dentro dos outros, levando muitos passageiros a pelarem fora. O choro de algumas crianças contrastava com os pedidos de socorro dos mais velhos, que se encontravam imprensados, entre as ferragens.

MORTOS — Às duas horas da madrugada, o sargento Antônio Ferreira da Silva identificou os mortos. Eis a relação: Olavo dos Santos (conferente da RMV), Maria José Carvalho, Elísio Guimarães (gerente do Banco da Lavoura, em Passa Tempo), Teresa Guimarães de Oliveira (esposa de Elísio), Dionísio da Silva Araújo (sapateiro e jogador do juvenil do Guarani), Osvaldo Tarcísio Moreno, lavrador), Joaquim Lopes Goulart (aposentado da RMV), e Origenes Paranhas (pedreiro em Carmo do Cajurú).

DESTINO — O prefeito de Carmo do Cajurú, Sr. João da Mata Nogueira, oi ver o cadáver de seu amigo de infância Elísio Guimarães, que era gerente do Banco da Lavoura em Passa Tempo. Não resistiu e lágrimas desceram de seus olhos, quando se aproximou do corpo de Teresa Guimarães de Oliveria, esposa de seu amigo Elísio. O casal deixa dois filhos menores, ainda não sabem da morte de seus pais e acreditam que eles estão fazendo uma longa viagem. Elísio Guimarães tinha 36 anos, e vinha a Belo Horizonte para uma consulta médica.

Uma visita de consolo à uma comadre foi o que levou dona Maria José de Carvalho, a Divinópolis. Lá ficou um dia e, na estação daquela cidade, despediu-se dizendo “até a próxima semana”. Seu marido, o operário Francisco Pereira de Carvalho, esperou-a na estação de Bernardo Monteiro, recebendo o cadáver sob os olhares curiosos de alguns desconhecidos. Sua vizinha, mulher do Sr. José Diniz, viajava ao lado de dona Maria José, e diz que ela foi valente até na hora da morte: Pedia que seus filhos fossem amparados, e gritava para ser retirada dali.   

  MÉDICO — Olavo dos Santos era conferente da RMV, e queria chegar domingo à noite a Belo Horizonte. Quando os gritos e choro das mulheres e crianças, saltou do trem em busca da salvação, e isso para ele significou a morte. Sua morte foi sentida por todos os ferroviários da região, pois Olavo dos Santos era muito estimado pelos colegas.

O SONHO — No caminho, o jovem de 20 anos, Dionísio ia contado ao seu companheiro de poltrona alguns dos seus sonhos: queria servir ao Exército e depois ser jogador profissional do Guarani, time de futebol que defendia como juvenil. Seu irmão, José Pedro da Silva foi busca-lo, depois de morto, chorando. Como torcedor do Guarani, Dionísio viajava para assistir ao jogo com o time de Itaúna. Já o sr. Joaquim Lopes Goulart, não teve parentes para chorar sua morte. Não sabiam que ele era um dos passageiros do PB-3. A polícia tirou de seus bolsos uma carteira contendo Cr$ 1.500,00 cruzeiros, um relógio que marcava a hora do desastre — 14h 20m — uma penca de chaves e uma caneta.

INQUÉRITO — A Rede Mineira mandou transportar os corpos para as casas de seus parentes, e deu toda a assistência às famílias das vítimas. O delegado de Itaúna, Afonso de Figueiredo Murta, acompanhado do Sargento Antônio Ferreira e de dois soldados, permaneceu no local até às 3 horas da madrugada, quando os trabalhos foram suspensos. O engenheiro Jôfre Loureiro ali esteve durante o dia e a noite, dirigindo os trabalhos de remoção dos cadáveres e concerto da linha. O diretor da RMV, o sr. Roberto Carneiro, compareceu ao local do desastre, e disse que o inquérito vai mostrar quais foram as causas do acidente, para que os responsáveis sejam punidos.  

FERIDOS — Estão internados no hospital de Itaúna, as seguintes pessoas: Otacir Nunes Contagem, Wilson Pereira da Silva, Osvaldo de Araújo, Geraldo Joaquim dos Santos, Maria José de Jesus e Alcides Antunes, além do mesmo Gerson. Os feridos foram atendidos por quatro médicos, todos da cidade de Itaúna: Virgílio Gonçalves de Souza, Ronaldo Aguiar, José de Campos e José Simonini. Mais tarde, chegaram outros quatro médicos de Belo Horizonte e Divinópolis.

O MENINO GERSON — Um menino pretinho, com aparência de quatro anos, chorava muito no hospital de Itaúna, chamando por seus pais. Os médicos e as enfermeiras, não sabem explicar como o menino Gerson foi parar sozinho no Hospital. Apresenta queimaduras na cabeça e num dos braços. O menino não diz os nomes de seus pais, e grita sempre por “mamãe”. As enfermeiras já gostam dele, e muitas já querem criá-lo caso seus pais não apareçam.

RELATÓRIO — O fiscal Cincinato Alves, que viajava no trem PB-3, já preparou um relatório para a direção da Rede Mineira de Viação, mostrando quais foram as causas do desastre. Embora nada queira adiantar, o fiscal Cincinato diz que escapou por milagre e que o trem viajava cheio. Conta que há 38 anos viaja nos trens da RMV, e que tem três filhos menores. 





Referências:

Pesquisa, arte e elaboração: Charles Aquino - Historiador nº 343/MG

Fonte impressa Jornal: Última Hora, 21 de janeiro, 1964, ed.04261, p.7. Hemeroteca Digital Brasileira.

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