domingo, outubro 13, 2024

DIONAS BARBEIRO

Dionas Barbeiro...

o capa preta

"Somos todos companheiros a beber o ano inteiro se és covarde, saia da mesa que a nossa empresa requer valor"... 

"Primeira bateria, vira, vira, vira, vira, vira ,vira, virou. Segunda bateria"... 

        A farra estava começando a toda naquele início de noite de sábado, no bar do “Tapa na Paca”, lá na Rua João de Cerqueira Lima em frente a antiga agência dos correios.

        - “Ô Tapa, traz mais uma cerveja” – exclamava o Zé do Desy, batendo o copo vazio sobre o velho balcão de madeira.

         - “Vê se passa um pano na mesa” – emendava o Ronaldo Noguerinha, acompanhado do Zé de Paula, Moacir Mariano e o Zé da Telefônica, “pois hoje tem baile no Clube União e daqui nós vamos diretos pro baile e depois prá zona boêmia, visitar as casas de rapariga, né Zé?

           Já passava das nove e meia da noite, o bar estava lotado, o vira, vira sendo cantarolado a plenos pulmões, quando ele chegou.  Em pé na porta do bar chamava a atenção de todos pela elegância do corte do terno preto risca de giz de casimira inglesa e da gravata listrada de branco e amarelo com um nó tipo cabeça de touro  sobressaindo sobre a camisa de seda branca.A vasta e negra cabeleira reluzia mostrando excesso de brilhantina.

           Deu um passo em direção ao balcão e ao solicitar um “rabo de galo” no capricho, abriu aquele sorriso generoso onde os alvos dentes se destacavam sob o bigode fino e bem aparado. Um figurão!

            - “Boa noite rapaziada” – falou o Dionas para o pessoal do bar.

            Barbeiro dos mais conceituados na cidade, com uma vasta e seleta clientela, sempre se sobressaia  pelo modo elegante  de se vestir. Ainda solteirão, apesar dos 59 anos, tinha um físico de atleta, sem barriga, rugas e papadas. O Dionas sabia se cuidar e era do conhecimento de todos esta sua grande vaidade.

            - “Olha só a elegância do Dionas, gente! – exclamou o Zé da telefônica.

            -“Taí o maior atleta de Itaúna” – interferiu o Zé do Desy – “Deve fazer ginástica todos os dias. Vai viver uns cem anos – “voltou a exclamar, ao mesmo tempo que caminhava a passos largos na direção ao recém chegado. – “Que isto, Zé! Bondade sua. Vocês é que são jovens, estão na flor da idade e sabem aproveitar bem a vida” – exclamou o recém chegado com um largo sorriso de satisfação.

            -“É ou não é um atleta pessoal ? Confessa Dionas! Diz pro pessoal qual é o segredo deste tipo físico de toureiro espanhol e esta aparência de menino? É ou não é ginástica todos os dias ?”

            -“ Bem, senhor Zé do Dezy” – exclamou o vaidoso Dionas já estufando o peito e demonstrando um ar de segurança e orgulho, mas se recusando  a se sentar  para não amarrotar o vinco  do terno novo que ia estrear logo mais  no baile do Clube União Operária

            - “A gente se cuida um pouco, faz uma ginástica para não perder a forma, mas você está exagerando meu jovem!”

            - “Mostra pró pessoal, Dionas” – falou o sacana do Zé do Desy, já se preparando para aprontar mais uma das suas – Faz uma demonstração dos tipos de ginástica que você faz que o pessoal quer aprender”.

                 Inicialmente, meio ressabiado, e trajando aquele belíssimo terno, o “Capa Preta”, apelido pelo qual era mais conhecido pelos boêmios da cidade, tirou o paletó, colocando-o cuidadosamente sobre uma cadeira e iniciou uma série de exercícios para delírio do pessoal que esta hora lotava o bar do Tapa na Paca.

                Já passava das dez e meia da noite e no apinhado bar, os olhares de todos se convergiam para aquele senhor de 59 anos, já sem camisa, meio suado, fazendo corrida simulada, sob o comando da voz estridente do Zé do Desy.

                  -“É um recorde , doze mil e oitocentas passadas em cinco minutos e vinte e oito segundos.”

              Quando o relógio da matriz bateu meia noite e meia, o Dionas estava só de cueca samba-canção, de bruços sob o chão forrado com papel de pão, suadinho, suadinho, descabelado e pálido, fazendo flexões  e o bar inteiro num som uníssono, contando - “Setenta e uma , setenta e duas, setenta e três, setenta e quatro,setenta e cinco....”

             Dizem que naquela noite, a sua ausência foi muito sentida no Clube União Operária, onde era um destacado pé de valsa, bem como no Bar do Sissi na zona boêmia, onde era um assíduo frequentador das casas de rapariga e que a sua barbearia só reabriu na quarta-feira à tarde quando foi visto descendo de um táxi, com ajuda do Júlio Magalhães............. 


Referências:

Texto/causo: Sérgio Tarefa 

Organização e arte: Charles Aquino