sábado, março 02, 2024

EDUCADORA ITAUNENSE DE PRESTÍGIO

ELSA NOGUEIRA GOMIDE


Itaúna é feliz pela qualidade de seus filhos. Entre estes avultam muitas mulheres notáveis. Elsa Nogueira Gomide, filha de Péricles Gomide e de Eponina Gomide — família de artistas. Gente de teatro, da imprensa e da literatura. Irmã do saudoso Piu da “Folha do Oeste” e, também, do sempre lembrado e sempre atual Pancrácio Fidelis, cronista imortal pela verve humorística. Soube relatar com espírito crítico, mas ameno nosso passado, com seus aspectos humanos e pitorescos.

Elsa, normalista, educadora e corajosa, superando na sua época preconceitos, sempre vitoriosa nos desafios que enfrentou. No Grupo Escolar Dr. Augusto Gonçalves, com a professora Dona Didina do Capitão Oscar, nunca ganhou menos do que a nota máxima. Terminou o primário com distinção e medalha de ouro. Continuou com o mesmo sucesso na Escola Normal sob competente direção do saudoso professor Anselmo Barreto.

Estagiária na arte de ensinar, depois professora primária, nomeada com salários de ontem e de hoje, sempre pouco condizentes com a importância do magistério, partiu para outras atividades. Aprendeu o alfabeto Morse com o telegrafista Ernesto e conviveu, no mesmo prédio com seu pai, o Lique, dublê de dentista e ator teatral, também agente do correio. Foi normalista, através de concurso público, em 1940, telegrafista para servir em Belo Horizonte. Jovem, solteira, enfrentou a capital, aos 22 anos, numa época em que as moças viviam agarradas às barras das saias de suas severas e exigentes mães.

Fez brilhante carreira como funcionária pública, jamais apadrinhada por prestígio político de quem quer que seja. Nos concursos públicos estava sempre nos primeiros lugares, assegurando-lhe nomeação por sua capacidade e competência. Assim foi para o Rio de Janeiro como escriturária, em pleno regime ditatorial, para servir na Diretoria do Pessoal no Ministério da Educação e Saúde. Na capital federal, não perdeu tempo. Nas horas vagas cursava línguas, fez estágio na Biblioteca Nacional.

Voltou para Belo Horizonte a serviço do Setor Pessoal dos Correios. Viveu muitos anos na capital mineira. Redemocratizado o país, no governo Dutra, enfrentou novo concurso do DASP em 1948, tornando-se Oficial de Administração. Retornou ao Ministério de Educação, sua casa de trabalho, ocupando vários cargos de confiança. Chefe de Seção, também responsável pela fiscalização da vida escolar dos estabelecimentos federais de todo país.

O Ministro Tarso Dutra precisou de alguém de alto nível e de sua confiança pessoal, fora dos quadros políticos, para exercer a função de Diretora do Departamento de Assuntos Universitários, em momento difícil, em que pesavam acusações sobre a pouca transparência naquele importante setor de ensino superior federal. Afastou os políticos e lá colocou uma técnica de seu ministério. A escolhida foi nossa ilustre e distinta conterrânea Elsa Gomide, que lá deveria ficar uns dois meses, até que crise fosse superada. Durante quase um ano e meio o cargo ficou em suas mãos competentes e limpas. Neste período tornou-se a madrinha da Universidade de Itaúna. Ela abriu as portas do Ministério para a nascente universidade — considerada até então como clandestina pelo Egrégio Conselho Federal de Educação — criada pelo Conselho Estadual, à revelia do Conselho Federal.

Deixando o cargo de Diretora do DAU, Elsa continuou como assessora de seu substituto, o ilustre Professor Edson Machado de Sousa, de quem me tornei amigo, por influência dela, à época em que fiz parte da Diretoria da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Superior de Minas Gerais. Naqueles tempos duros e difíceis em que a Universidade vivia sua pobreza franciscana, Elsa, em 1969, concedeu-nos a primeira verba federal, Cr$ 101.000,00(cento e um mil cruzeiros) — valor da época. Desde então, a Universidade, ao longo de dez anos, foi aquinhoada com as verbas federais. Nos anos de 1970 e 1971 recebemos, respectivamente, Cr$ 154.745,70 e Cr$ 323.155,00, graças a sua intervenção e prestígio.

Elsa aposentou-se em 1970, mas tamanha sua capacidade técnica e administrativa, continuou servindo, reconvocada pelos ministros que se sucederam. Tornou-se secretária particular da Ministra Ester de Figueiredo Ferraz. Com o término do mandato da ministra, Elsa foi requisitada para servir como assessora do Conselho Federal de Educação. Graças à sua influência, sempre olhando com carinho e boa vontade aos nossos apelos, essa generosa e notável servidora pública, com honestidade e incomum senso patriótico, tudo fez para que recebêssemos os seguintes valores do Governo Federal — 1973 (600 mil cruzeiros), 1974 (600 mil cruzeiros), 1975 (700 mil cruzeiros), 1976 (400 mil cruzeiros), 1977 (500 mil cruzeiros) e 1978 (700 mil cruzeiros).

Elsa aposentou-se em 1988. Foi a itaunense que mais ajudou a Universidade de Itaúna em momentos difíceis. Criada pelo Governador Magalhães Pinto, através de seu representante para os atos consultivos, Dr. Miguel Augusto Gonçalves de Souza, a Fundação recebeu do Estado um papel, apólice da dívida pública, sem correção monetária, que poucos anos depois nada valia. Seu patrimônio ficou reduzido a zero. Graças aos nossos esforços perante o poder público municipal e ajuda dos Governadores Aureliano Chaves e Francelino Pereira na área estadual, conseguimos recriar seu patrimônio — porque fundação não existe sem patrimônio. Recursos financeiros nós só tínhamos os provenientes das anuidades dos alunos e das verbas conseguidas pela cidadã itaunense Elsa Nogueira Gomide. A ajuda financeira que recebíamos de empresas e da Prefeitura transformávamos em bolsas de estudo para operários e alunos carentes.

É enorme a dívida de gratidão dos itaunenses gratos e reconhecidos para com esta notável cidadã, humilde e simples, que nasceu para servir sem jamais desejar ser servida.     

 

Referências:

Texto: Guaracy de Castro Nogueira (In Memoriam)*

Fonte e imagem: Jornal Folha do Povo, Ed. nº266 de 21 de setembro 2002, p.2.

Organização, pesquisa e adaptação do texto para o blog: Charles Aquino