Itaúna é feliz pela qualidade de
seus filhos. Entre estes avultam muitas mulheres notáveis. Elsa Nogueira
Gomide, filha de Péricles Gomide e de Eponina Gomide — família de artistas.
Gente de teatro, da imprensa e da literatura. Irmã do saudoso Piu da “Folha do
Oeste” e, também, do sempre lembrado e sempre atual Pancrácio Fidelis, cronista
imortal pela verve humorística. Soube relatar com espírito crítico, mas ameno
nosso passado, com seus aspectos humanos e pitorescos.
Elsa, normalista, educadora e corajosa,
superando na sua época preconceitos, sempre vitoriosa nos desafios que
enfrentou. No Grupo Escolar Dr. Augusto Gonçalves, com a professora Dona Didina
do Capitão Oscar, nunca ganhou menos do que a nota máxima. Terminou o primário
com distinção e medalha de ouro. Continuou com o mesmo sucesso na Escola Normal
sob competente direção do saudoso professor Anselmo Barreto.
Estagiária na arte de ensinar, depois
professora primária, nomeada com salários de ontem e de hoje, sempre pouco
condizentes com a importância do magistério, partiu para outras atividades.
Aprendeu o alfabeto Morse com o telegrafista Ernesto e conviveu, no mesmo
prédio com seu pai, o Lique, dublê de dentista e ator teatral, também agente do
correio. Foi normalista, através de concurso público, em 1940, telegrafista para
servir em Belo Horizonte. Jovem, solteira, enfrentou a capital, aos 22 anos,
numa época em que as moças viviam agarradas às barras das saias de suas severas
e exigentes mães.
Fez brilhante carreira como funcionária
pública, jamais apadrinhada por prestígio político de quem quer que seja. Nos
concursos públicos estava sempre nos primeiros lugares, assegurando-lhe
nomeação por sua capacidade e competência. Assim foi para o Rio de Janeiro como
escriturária, em pleno regime ditatorial, para servir na Diretoria do Pessoal
no Ministério da Educação e Saúde. Na capital federal, não perdeu tempo. Nas horas
vagas cursava línguas, fez estágio na Biblioteca Nacional.
Voltou para Belo Horizonte a
serviço do Setor Pessoal dos Correios. Viveu muitos anos na capital mineira.
Redemocratizado o país, no governo Dutra, enfrentou novo concurso do DASP em 1948,
tornando-se Oficial de Administração. Retornou ao Ministério de Educação, sua
casa de trabalho, ocupando vários cargos de confiança. Chefe de Seção, também
responsável pela fiscalização da vida escolar dos estabelecimentos federais de
todo país.
O Ministro Tarso Dutra precisou
de alguém de alto nível e de sua confiança pessoal, fora dos quadros políticos,
para exercer a função de Diretora do Departamento de Assuntos Universitários,
em momento difícil, em que pesavam acusações sobre a pouca transparência
naquele importante setor de ensino superior federal. Afastou os políticos e lá
colocou uma técnica de seu ministério. A escolhida foi nossa ilustre e distinta
conterrânea Elsa Gomide, que lá deveria ficar uns dois meses, até que crise
fosse superada. Durante quase um ano e meio o cargo ficou em suas mãos competentes
e limpas. Neste período tornou-se a madrinha da Universidade de Itaúna. Ela
abriu as portas do Ministério para a nascente universidade — considerada até
então como clandestina pelo Egrégio Conselho Federal de Educação — criada pelo
Conselho Estadual, à revelia do Conselho Federal.
Deixando o cargo de Diretora do
DAU, Elsa continuou como assessora de seu substituto, o ilustre Professor Edson
Machado de Sousa, de quem me tornei amigo, por influência dela, à época em que fiz
parte da Diretoria da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Superior de
Minas Gerais. Naqueles tempos duros e difíceis em que a Universidade vivia sua
pobreza franciscana, Elsa, em 1969, concedeu-nos a primeira verba federal, Cr$ 101.000,00(cento
e um mil cruzeiros) — valor da época. Desde então, a Universidade, ao longo de dez
anos, foi aquinhoada com as verbas federais. Nos anos de 1970 e 1971 recebemos,
respectivamente, Cr$ 154.745,70 e Cr$ 323.155,00, graças a sua intervenção e
prestígio.
Elsa aposentou-se em 1970, mas
tamanha sua capacidade técnica e administrativa, continuou servindo,
reconvocada pelos ministros que se sucederam. Tornou-se secretária particular
da Ministra Ester de Figueiredo Ferraz. Com o término do mandato da ministra,
Elsa foi requisitada para servir como assessora do Conselho Federal de
Educação. Graças à sua influência, sempre olhando com carinho e boa vontade aos
nossos apelos, essa generosa e notável servidora pública, com honestidade e incomum
senso patriótico, tudo fez para que recebêssemos os seguintes valores do
Governo Federal — 1973 (600 mil cruzeiros), 1974 (600 mil cruzeiros), 1975 (700
mil cruzeiros), 1976 (400 mil cruzeiros), 1977 (500 mil cruzeiros) e 1978 (700
mil cruzeiros).
Elsa aposentou-se em 1988. Foi a
itaunense que mais ajudou a Universidade de Itaúna em momentos difíceis. Criada
pelo Governador Magalhães Pinto, através de seu representante para os atos
consultivos, Dr. Miguel Augusto Gonçalves de Souza, a Fundação recebeu do
Estado um papel, apólice da dívida pública, sem correção monetária, que poucos
anos depois nada valia. Seu patrimônio ficou reduzido a zero. Graças aos nossos
esforços perante o poder público municipal e ajuda dos Governadores Aureliano
Chaves e Francelino Pereira na área estadual, conseguimos recriar seu
patrimônio — porque fundação não existe sem patrimônio. Recursos financeiros
nós só tínhamos os provenientes das anuidades dos alunos e das verbas
conseguidas pela cidadã itaunense Elsa Nogueira Gomide. A ajuda financeira que
recebíamos de empresas e da Prefeitura transformávamos em bolsas de estudo para
operários e alunos carentes.
É enorme a dívida de gratidão dos
itaunenses gratos e reconhecidos para com esta notável cidadã, humilde e
simples, que nasceu para servir sem jamais desejar ser servida.
Referências:
Texto:
Guaracy de Castro Nogueira (In Memoriam)*
Fonte e imagem:
Jornal Folha do Povo, Ed. nº266 de 21 de setembro 2002, p.2.
Organização,
pesquisa e adaptação do texto para o blog: Charles Aquino