Mais
de um século de História, Fé e Memória na vida religiosa de Itaúna
No dia 22 de setembro de 1915, foi concedida, em Mariana/MG, a licença eclesiástica para a bênção da Capela de Santo Antônio do Campo Alegre, hoje conhecida como Capela de Santo Antônio de Vista Alegre, em Itaúna/MG.
O ato, registrado em documento oficial, foi assinado por Dom Silvério Gomes Pimenta, então Arcebispo Metropolitano de Mariana, e redigido por Monsenhor José Silvério Horta, secretário da Cúria.
O pedido partiu do vigário local, Padre João Ferreira
Álvares da Silva, que buscava oficializar a capela erguida pela comunidade, a
fim de nela se celebrar a missa e administrar os sacramentos.
À época, o vigário registrava que a freguesia de Sant’Ana de Itaúna contava com uma população de “aproximadamente sete mil almas” e dispunha dos seguintes templos: na sede, além da matriz, a antiga matriz, então transformada em Igreja do Rosário; a Igreja do Monte; e a Capela do Senhor dos Passos.
Havia ainda, nas
zonas rurais, a Capela de Nossa Senhora de Lourdes, a 14 km ao sul da sede; a
Capela de Santo Antônio do Campo Alegre, a 12 km a oeste; a Capela de Santo
Antônio do Brejo Alegre, a 16 km a noroeste; e a Capela de São Sebastião dos
Paulas, a 12 km ao norte.
O documento
determinava que o templo deveria ser sólido, decente e dotado do necessário
para o culto, bem como possuir patrimônio suficiente para a sua manutenção.
Somente após a devida regularização e bênção, os sacramentos poderiam ser
administrados no local. Esse ato representou não apenas a institucionalização
do espaço religioso, mas também o reconhecimento da fé e da mobilização
comunitária no arraial de Campo Alegre.
Em 2025,
celebram-se 110 anos da bênção da capela, um marco que une a história da
Arquidiocese de Mariana e a fé popular de Itaúna. O documento de 1915 não é
apenas um registro burocrático, mas um testemunho da articulação entre
comunidade, pároco e hierarquia eclesiástica para consolidar um espaço sagrado
que permanece vivo na memória coletiva.
Assim, ao
recordar este centenário e uma década, resgatamos também as trajetórias de Dom
Silvério, Monsenhor Horta e Padre João Ferreira, cujas vidas se cruzaram nesse
episódio e que, cada um a seu modo, contribuíram para a história da Igreja e da
religiosidade no interior de Minas Gerais.
Os
protagonistas deste registro histórico
Padre João
Ferreira Álvares da Silva (1862–1950)
Natural de Abadia
de Pitangui (atual Martinho Campos/MG), nasceu em 13 de dezembro de 1862.
Iniciou seus estudos de humanidades em Pitangui e os concluiu no tradicional
Colégio do Caraça, onde também cursou o primeiro ano do Seminário Maior.
Posteriormente, transferiu-se para Mariana, onde concluiu a formação sacerdotal
em 1885.
Exerceu o ministério em diversas paróquias do interior mineiro, atuando como vigário em Morada Nova de Minas, Paranaíba, Abaeté, Chapéu d’Uvas e São Miguel do Anta, até assumir, em 1902, a paróquia de Itaúna, onde deixou forte marca pastoral.
Em sua trajetória no município, destacou-se especialmente em 1919, quando
participou, ao lado de Dom Silvério Gomes Pimenta, da solenidade de bênção do
Hospital da Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Souza Moreira, instituição que
se tornaria referência na assistência à saúde da região.
Dom Silvério
Gomes Pimenta (1840–1922)
Natural de
Congonhas (MG), foi o primeiro bispo negro do Brasil, além de notável
intelectual, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL). Destacou-se pela
erudição, pelo latim impecável e pelo papel ativo na vida da Igreja. Foi Bispo
de Mariana (1896–1906) e, depois, Arcebispo Metropolitano (1906–1922). É
lembrado como uma figura “além do seu tempo”, defensor da fé, da educação e da
dignidade humana.
Monsenhor José
Silvério Horta (1859–1932)
Nascido em Barra
Longa (MG), dedicou 47 anos ao sacerdócio, atuando como secretário do bispado e
vigário-geral da Arquidiocese de Mariana. Reconhecido pela dedicação pastoral e
pela assistência aos pobres, tornou-se figura venerada, chegando a ter processo
de beatificação iniciado em 2010. Foi ele quem redigiu o documento de 1915,
registrando oficialmente a concessão da licença para a bênção da capela.
Segue a transcrição da carta oficial
de 1915, assinada por Dom Silvério Gomes Pimenta e lavrada por Monsenhor José
Silvério Horta, a pedido do vigário Padre João Ferreira Álvares da Silva:
D.
Silverio Gomes Pimenta pela graça de Deus e da Santa Sé Apostolica arcebispo
Metropolitano de Marianna Prelado Domestico de Sua Santidade Bento XV e
Assistente ao Solio Pontificio, etc. etc.
Aos
Fieis Christãos saudação paz e benção em J. C.
FAZEMOS
saber que tendo os fieis de Santa Antonio do Campo Alegre freguezia de Santa
Anna do Itauna, deste Arcebispado, edificado uma Capella para facilitar a
administração dos Sacramentos e funções do culto divino, e havendo o Rvmo.
Vigario Pe. João Ferreira Alvares da Silva, requerido licença Nossa para
benzel-a.
HAVEMOS
por bem lhe conceder a licença pedida, como pela presente lhe concedemos,
contanto que esteja decente, solida e provida do necessario para o culto e
tenha suficiente patrimonio, cujo titulo legal deverá ser exhibido em Nossa
Curia Archiepiscopal.
Só
então podem ser nessa Capella celebrados o santo sacrificio da Missa e
administrados os sacramentos por qualquer sacerdote approvado neste
Arcebispado, servatis servandis, e salvos os direitos parochiaes. Ao pé desta
se lavrará a acta da benção da qual se remetta copia authentica á Nossa Curia
Ecclesiastica. Registre-se na Camara Ecclesiastica e no livro da Matriz.
Dada
em Marianna sob Nosso Signal e Sello de Nosso Vigario Geral aos 22 de Setembro
de 1915. Eu Monsenhor José Silverio Horta Escrevão da Camara Ecclesiastica, a
escrevi. <Monsenhor Horta>.
Referências
Realização: Charles Aquino – Historiador Registro nº 343/MG
Colaboração e apoio a pesquisa: Professor Luiz Mascarenhas
ARQ. MARIANA. Processo de Monsenhor Horta.
Disponível em: https://arqmariana.com.br/processo-de-monsenhor-horta/.
Acesso em: 14/09/2025.
ARQ. MARIANA. Um bispo além do seu tempo:
Arquidiocese de Mariana celebra o centenário de falecimento de Dom Silvério.
Disponível em: https://arqmariana.com.br/noticia/um-bispo-alem-do-seu-tempo-arquidiocese-de-mariana-celebra-o-centenario-de-falecimento-de-dom-silverio/.
Acesso em: 14/09/2025.
ARQUIVO
ECLESIÁSTICO DA ARQUIDIOCESE DE MARIANA. Licença e bênção da Capela de Santo
Antônio do Campo Alegre, Itaúna/MG. Cúria Metropolitana, 1915. Documento
manuscrito.
LIVRO TOMBO PARÓQUIA SANT’ANA — 1902 a 1947, p. 1v.
Imagem meramente ilustrativa criada com IA, inspirada no conteúdo do texto.