quinta-feira, agosto 04, 2022

FAZENDA DA CACHOEIRA (SANTANENSE)

 SOUSA. Iracema Fernandes de

Cachoeira era o bairro no qual se construía a primeira fábrica de tecidos em Sant’Ana. Já haviam sido construídas várias casas, onde a Rua de Baixo tomava toda lateral da indústria. Do outro lado já havia o convento que abrigava vinte e uma moças e mais: Abadessa, conselheira e cozinheira. O regime era rígido, moço ali não entrava; só podiam fazer serestas com o máximo respeito. Era a ordem do gerente. O Antônio Mourão levou a sobrinha para pedir o emprego e, se o conseguisse, queria também recomendar-lhe a proteção daquela menina. Jesuína era ajuizada e sabia trabalhar como tecelã. Seu Moreira, o gerente, assumiu a responsabilidade conforme o pedido do amigo.

Chegando ao convento, logo se fez amiga das colegas e superiora. Passado um mês de trabalho, a casa começou a ficar mal assombrada! Era um barulho à noite, que ninguém conseguia dormir. As moças suavam de medo sem descobrir o que havia. As tábuas do assoalho davam a impressão: de se arrancarem todas.

Jesuína disse para as colegas: — “Eu prometi à alma de meu pai uma missa, logo no primeiro pagamento de meu novo emprego. O pagamento já se deu e eu, que precisava de tantas coisas, não me apressei a pagar a promessa. Quem sabe ele estará me lembrando do que eu não cumpri?” As colegas se reuniram e ajudaram a pagar a espórtula da missa e foram todas assistir à cerimônia religiosa. Dona Joaquina, a Abadessa, foi ter com seu Moreira, para relatar o que estava ocorrendo. O gerente mandou chamar dois rapazes de sua confiança, para descobrirem o mistério. Qual não foi a surpresa, ao encontrarem um cão raivoso que, tendo entrado assoalho a dentro não dera conta de sair.” Foi preciso matá-lo a tiros, para se retirar, sem ofender a ninguém. Assim, acabou: o pesadelo que tanto fez sofrer as moças daquele pensionato.

A fazenda da Cachoeira, onde foi construída a fábrica de Tecidos Santanense, era de propriedade de Coronel Manoel José Gonçalves do Souza Moreira, pai do então gerente, Manoel José Gonçalves de Souza Moreira. As casas da Rua de Baixo, onde abrigavam os primeiros operários, eram a senzala da fazenda, dividida para as famílias: apenas três ou quatro cômodos. Como a divisão era de uns três metros de altura, os percevejos, pulgas e por fim a tuberculose, achavam facilidades para comunicarem em todas as casas. Houve uma ocasião em que muita gente tinha medo até de passear, em visita aos amigos temendo assim o contágio.

 A casa do engenho onde se fabricavam rapaduras e cachaça para abastecer a vila, até bem pouco ainda existia na entrada do bairro. Com o correr do tempo a senzala fora demolida. Construía-se uma casa nova para uma família, destruía-se em seguida uma parte da antiga morada. E assim, gradativamente, uma por uma, até alcançar a completa higienização da indústria. No princípio tudo é assim mesmo, exigindo perseverança e espírito de desafio para vencer. Foi o que aconteceu. Venceu e prosperou vertiginosamente.




Iracema Fernandes de Souza



Referências:

Texto: Iracema Fernandes de Sousa. Itaúna através dos tempos. Editora Lemi S/A., BH, 1ªed, 1984, p.17,18.

Organização: Charles Aquino

Dica e apoio a leitura: Jaime Machado Júnior.

P.S.: A escrita de Iracema é tão rica em detalhes, e suas histórias são tão agradáveis, que o texto precisou ser registrado por completo.

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