*Toni Ramos GONÇALVES
A
última vez que estive com minha mãe, eu tinha dezessete anos, era fim de tarde
e retornava do trabalho. Convenci o porteiro do hospital a me deixar entrar,
uma vez que não o fiz no horário de visita.
Ela
me recebeu, com um leve sorriso e a mesma esperança. “Trouxe cigarros? ” “Não,
mãe. O médico proibiu, lembra? ” Sentei na cama, e instantaneamente acariciou
meu rosto queimado pelo sol. “Quero ir embora. Quero comer angu com couve.
Saudade de minha comida. ”
Fazia
vinte e dois dias que estava internada por causa de um AVC. Adoeceu no dia de
seu aniversário de trinta e cinco anos. Desmaiou na casa da vizinha, que a
socorreu levando-a ao hospital. O atendimento só foi realizado dez horas depois
do ocorrido.
“O
médico deve dar alta em breve, a senhora vai ver.” Assim eu pensava e me
iludia, mesmo depois do médico relatar o diagnóstico e revelar a gravidade da
doença na noite da internação para mim e minha irmã, de apenas doze anos.
Ficamos
ali, mãe e filho, de mãos dadas por alguns minutos, no silêncio frio daquele
quarto. Olhei para os lados, os outros dois leitos estavam ocupados e as
enfermas dormiam. “Cadê aquele senhora que estava aqui ontem, mãe?” Ela olhou
para o lado direito. “Morreu hoje cedo. E colocaram essa outra aí.”
Olhei
para minha mãe e vi uma tristeza imensa em seus olhos, que se umedeceram logo
em seguida. “Está triste, mãe. Chora não” Acariciei seus cabelos e dei um
abraço que durou alguns minutos, mas que podiam ser eternos.
O
medo pelo futuro ameaçador fez que eu me distanciasse e decidisse ir embora.
“Mãe, tenho que ir.” Ela me fitou ainda segurando minha mão e me fez o mesmo
pedido das outras visitas. “Não brigue com sua irmã.”
“Tá mãe, pode deixar.”
Beijei seu rosto, algo muito incomum para mim e me afastei sem olhar para trás.
No corredor, eu já estava aos prantos. Chorei todo trajeto para casa. Nunca
mais vi minha mãe viva. Arrependo de não ter prolongado mais aqueles minutos
finais.
No
dia seguinte, às 14h20, ela faleceu. Minha irmã ligou do hospital avisando.
Agora, passados três décadas, eu com os cabelos já grisalhos, ainda carrego
essa lembrança comigo. Na época, a vida que já era difícil, por ser filho de
mãe solteira, tornou-se ainda pior.
Morei
com avó, tia, até encontrar meu caminho. Foi uma longa jornada. Nos anos
seguintes, casei com uma mulher linda e maravilhosa, tive dois filhos que muito
me orgulham, além de ter um cão que esquenta meus pés enquanto escrevo meus
textos. A vida é assim, temos que seguir, sempre.
Amanhã
é o dia das mães. Tem muito tempo que ela se foi. Bateu a saudade, com força,
confesso. Ela sempre será jovem em minhas lembranças. Vou convidar minha irmã
para um almoço em família, é preciso. Que lasanha que nada, vou mudar o
cardápio e pedir um angu com couve.... Ah, vou sim.
Beijos
mãe, onde quer que esteja.