domingo, agosto 07, 2016

CHAFARIZ DE ITAÚNA

ÁGUAS DO CHAFARIZ DE ITAÚNA

1880

Símbolo de abundância de água, o chafariz era local também de sociabilidade e pessoas a parolar. Frequentado por vários tipos de classes, além de buscar água, o local servia para colocar a conversa em dia, enquanto esperavam que seus tonéis fossem enchidos, os responsáveis aproveitavam para “espalhar notícias e principalmente as difamações sobre seus patrões ”.

Segundo nos informa Marjolaine Carles, Vila Rica (hoje Ouro Preto) “dava um banho´d’agua” no Rio de Janeiro. Em Minas Gerais final do século XVIII, a capital tinha dezoito chafarizes mais tantos outros espalhados pelas redondezas da sede do governo, o qual contava com uma população de 8 mil habitantes.  Neste ponto, o Rio de Janeiro, Capital da Colônia, perdia de muito longe para Minas Gerais, tinha somente apenas onze chafarizes para cerca de 30 mil habitantes. 

Nestes chafarizes, além de ofertas de abundantes águas e boas prozas, eram locais de grande proliferação de atividades urbanas – domésticas, artesanais, industriais, sustentando profissões de aguadeiros e lavadeiras.  A isto, segundo nos informa Claudia Lopes, o chafariz era uma obra pública e tinha a importância e caráter, sendo classificados em três grupos: funcionais, decorativos e monumentais[1].

    Em Sant’Anna de São João Acima (hoje Itaúna), a Assembleia Legislativa Provincial de Minas Geraes, autorizava o projeto de nº 181  para construção de um chafariz:

Art. Único. Fica o governo autorizado a despender a quantia de 4:000$000 (quatro contos de réis) com a construção de um chafariz no arraial de Sant’ Anna de São João Acima, pertencente ao município do Pará, comarca de Sete Lagoas; revogadas as disposições.
Sala das sessões, 22 de outubro de 1880 -  Costa Sena, Amaro, José Rufino, Ferras Junior, Ovídio de Andrade, Drummond.

O valor de quatro contos de reis, para a construção de um chafariz em Sant’ Anna de São João Acima naquele período, seria uma quantia muito expressiva e opulenta.  

O papel social e urbano dos chafarizes em Minas Gerais no final do século XVIII e início do XIX, destacando o chafariz como um símbolo não apenas de abundância de água, mas também como um espaço de convivência social e desenvolvimento urbano. Em locais como Vila Rica (atual Ouro Preto) e o arraial de Sant'Anna de São João Acima (atual Itaúna), essas estruturas desempenhavam funções vitais, tanto práticas quanto simbólicas.

A importância do chafariz ia além de sua função de fornecimento de água. Esses locais eram pontos de encontro onde diferentes classes sociais se reuniam para buscar água e, ao mesmo tempo, interagir. Pessoas conversavam e até colocavam as notícias em dia fazendo seus "fuxicos". Assim, os chafarizes desempenhavam um papel de comunicação informal, sendo centros de sociabilidade e troca de informações. Esse aspecto mostra que, além de resolver uma necessidade básica da população, eles eram fundamentais para a formação de laços sociais nas comunidades.

A comparação entre Vila Rica e a cidade do Rio de Janeiro no final do século XVIII ressalta o contraste no número de chafarizes entre as duas regiões, evidenciando o avanço de Minas Gerais em termos de abastecimento de água pública. Enquanto Vila Rica, com uma população de 8 mil habitantes, tinha dezoito chafarizes, a capital da Colônia, com cerca de 30 mil habitantes, possuía apenas onze. 

Isso mostra como o planejamento urbano e o investimento em infraestrutura em Minas Gerais eram mais desenvolvidos em relação ao Rio de Janeiro. O chafariz também fomentava o desenvolvimento de profissões relacionadas ao abastecimento e uso de água, como aguadeiros e lavadeiras. Isso transformava esses monumentos em pontos estratégicos de atividades econômicas urbanas, servindo para além de um simples abastecimento de água, mas também para sustentar práticas cotidianas e artesanais que estruturavam a vida da cidade.

De acordo com a classificação de Claudia Lopes, os chafarizes podiam ser funcionais, decorativos ou monumentais. Os funcionais eram utilitários e simples, localizados fora dos centros comerciais e administrativos. Já os decorativos tinham elementos ornamentais que valorizavam a paisagem urbana. Por fim, os monumentais eram grandes obras de arte, com complexos elementos barrocos e localizados em pontos de destaque das cidades.

Em Sant'Anna de São João Acima, a construção de um chafariz em 1880, autorizada pela Assembleia Legislativa Provincial de Minas Gerais, demonstra o empenho da administração pública em melhorar o abastecimento de água e, ao mesmo tempo, em valorizar o espaço urbano. O valor de quatro contos de réis destinado a essa construção revela o grande investimento financeiro necessário para essas obras de infraestrutura, o que indica a importância que esse tipo de empreendimento tinha para as autoridades da época.

Expandindo essa análise, podemos refletir sobre a relevância dos chafarizes não apenas como fontes de água, mas também como símbolos de poder público e de urbanização. Eles eram um marco de desenvolvimento e civilidade, demonstrando como o espaço público era pensado e utilizado em sociedades do passado. A presença de monumentos como esses reafirma a centralidade da água na organização da vida cotidiana, não apenas como recurso, mas como elemento de articulação social, política e cultural.

Ao considerar a construção de um chafariz em Sant'Anna de São João Acima, é possível perceber que a obra pública transcende o simples objetivo de fornecer água. Ela se insere em um contexto mais amplo de desenvolvimento urbano e social, refletindo o papel das infraestruturas públicas na promoção do bem-estar coletivo e na construção da identidade das cidades. O investimento em chafarizes demonstra o reconhecimento da água como um recurso vital e estratégico para a vida urbana, mas também como um meio de promover a coesão social, a estética urbana e o desenvolvimento econômico.

Em suma, os chafarizes eram mais do que estruturas utilitárias; eles eram elementos integradores do espaço público, promovendo tanto a funcionalidade quanto a beleza e a sociabilidade nas cidades. Eles simbolizavam a interseção entre o cotidiano e o extraordinário, entre o pragmático e o ornamental, moldando a paisagem urbana e as relações humanas em torno de um recurso essencial: a água.




[1] - Funcionais: monumentos utilitários com pouquíssima ornamentação e quase nenhuma preocupação estética, geralmente afastados dos centros administrativo e comercial da vila. Exemplos: ponte do padre faria e chafariz da rua das cabeças
- Decorativos: começa a haver uma maior preocupação com a ornamentação das ruas, sendo que nesses monumentos já aparecem elementos em cantaria, ainda que pequenos. Exemplos: ponte do pilar, chafariz do rosário e chafariz da rua barão de ouro branco.
- Monumentais: obras que ocupavam posição de destaque na paisagem da cidade,sendo de grandes proporções e merecendo extremo cuidado no desenho e execução. Apresentamse bem ornamentados, dotando de diversos elementos barrocos. Exemplos: ponte de antônio dias, chafariz de marília e chafariz dos contos.


Referências:

CARLES, Marjolaine.  Fontes sob controle: Revista de História, 2013.

LOPES, Claudia. Arquitetura oficial no período colonial: um estudo sobre as pontes e chafarizes de Ouro Preto. 

Fotografia ilustrativa.

Jornal: A Actualidade -  Ouro Preto, 1880. n° 127 p.3.

Elaboração e Pesquisa: Charles Aquino, graduando em História pela UEMG/Divinópolis 6º período.