quarta-feira, dezembro 23, 2020

BATISMO EM SANT’ANA

"Baptismo em Sant’Ana: Nossos Filhos Eram Gregos" apresenta uma fascinante incursão na história do batismo na região de Sant’Anna do Rio São João Acima, atualmente conhecida como Itaúna, destacando a influência da cultura grega nesse contexto. 

Inicialmente, é ressaltada a importância do batismo como o primeiro sacramento da Igreja Católica, conforme as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, que datam do século XVIII. Essas constituições, aceitas em um sínodo diocesano em 1707, buscavam adaptar as normas eclesiásticas estabelecidas pelo Concílio de Trento às peculiaridades brasileiras.

O texto destaca a dedicação do Padre Antônio Maximiano de Campos, responsável por realizar inúmeros batismos na região durante o século XIX. Em particular, ele descreve um caso único envolvendo o casal Jove Soares Nogueira e Augusta Gonçalves Nogueira, que buscavam se casar, requerendo uma dispensa de impedimento devido ao parentesco consanguíneo. O padre, que havia batizado o noivo em 1868, redigiu uma petição ao Bispado de Mariana solicitando essa isenção.

Um elemento interessante é a influência da cultura grega nos nomes de recém-nascidos batizados em Sant’Ana. Embora a tradição religiosa favorecesse nomes de santos conhecidos, alguns pais e padrinhos optaram por nomes de origem grega, o que reflete a persistência dessa influência cultural.

Os registros de batismo mencionados fornecem um vislumbre da prática da época, incluindo detalhes como nomes dos pais, padrinhos e o procedimento cerimonial. Além disso, as Constituições Primeiras estabeleciam diretrizes específicas para o batismo, desde a administração do sacramento até a manutenção dos registros nos livros da igreja.

Em suma, o texto oferece uma narrativa detalhada e envolvente sobre a prática do batismo em Sant’Ana do Rio São João Acima, destacando a influência cultural grega e os aspectos administrativos e cerimoniais associados a esse sacramento na época.


BAPTISMO EM SANT’ANA: NOSSOS FILHOS ERAM GREGOS

A cultura grega deixou um magnificente galardão cultural influenciando também outras civilizações. Em Sant’Anna do Rio São João Acima (hoje Itaúna) não foi diferente, esse legado reverberou em algumas almas do nosso arraial através do primeiro sacramento - Baptismo.

É bem antiga a prática do baptismo sendo “o primeiro de todos os sacramentos, e a porta por onde se entra na Igreja Católica, e se faz, o que o recebe, capaz dos mais Sacramentos, sem o qual nem um dos mais fará nele o seu efeito” (Constituições, 1853, Livro I, Título. X). Os assentos de baptismos, casamentos e óbitos eram registrados em Livros distintos pela igreja e foram ajustados a um amplo código jurídico eclesiástico para o Brasil - As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia.  A obra distribuída em cinco volumes, aceitas em o Sínodo Diocesano, celebrado em 12 de junho de 1707 pelo Arcebispo Dom Sebastião Monteiro da Vide (5º Arcebispo do dito Arcebispado e do Conselho de Sua Majestade). As Constituições “formavam um compêndio versando sobre normas eclesiásticas e que procuravam adequar o que preceituara o Concílio de Trento (1545-1563) às terras brasileiras e às suas peculiaridades” (Magalhães,2011).

No Livro I das Constituições informa que: “causa o Sacramento do baptismo efeitos maravilhosos, por que por ele se perdoam todos os pecados, assim original, como atuais, ainda que sejam muitos, e muitos graves. É o batizado em filho de Deus, e feito herdeiro da Glória, e do Reino do céu”. Após o nascimento da criança, realizava-se o primeiro sacramento o mais breve possível, no qual, “morrendo sem ele perdem a salvação, mandamos, conformando-nos com o costume universal do nosso Reino, que sejam batizadas até os oito dias de vida depois de nascidas” (Constituições, 1853, Livro I, Título, XI, X).  

Durante o século XIX, especificamente na Paróquia de Sant'Anna (hoje Itaúna), o Padre Antônio Maximiano de Campos realizou inúmeros batismos de famílias da região. Os registros de batismo incluíam apenas os primeiros nomes dos pais e padrinhos, enquanto os casamentos e óbitos eram registrados com segundos nomes e sobrenomes. A dedicação do Padre Maximiano na realização destes baptismos era conhecida em todo o concelho e região. Em 1894, o Padre Maximiano encontrou-se numa situação única. Um casal, Jove Soares Nogueira e Augusta Gonçalves Nogueira, que residia no arraial de Santana, procurava casar. Porém, devido ao relacionamento consanguíneo, necessitavam de isenção do habitual processo de impedimento. Reconhecendo o desejo de se unirem em matrimônio, Padre Maximiano encarregou-se de redigir uma petição ao Bispado de Mariana, solicitando essa isenção. É importante notar que o padre batizou o noivo, Jove Soares Nogueira, em 1868. Esta ligação acrescentou uma camada interessante à história e exemplificou o vínculo estreito entre o padre e as famílias que servia. Eis o documento transcrito:

Saúdo afetuosamente a Vossa Excelência Reverendíssimo desejando-lhe boa saúde e paz no Santíssimo Coração de Jesus. Os Oradores que suplicaram a dispensa em 05 deste corrente mês são, não José como por equívoco foi escrito na referida dispensa, mas sim Jove Nogueira Soares e Augusta Gonçalves Nogueira como foi na petição cujo dispensa ajunto a outra petição, que vai para Vossa Excelência Reverendíssimo corrigir a falta o que não seria talvez necessário; porém como temos prazo ainda suficiente até o casamento, venha corrigido para livrar-me de escrúpulo. Há invenção do povo desta freguesia adotar nomes ridículos e que não sabem o que significa nem donde procedem. Tenho trabalhado para que adotem, conforme o espírito da Igreja, nomes de Santos conhecidos, mas obstinam-se a esquisitices repugnantes ao ponto de tornarem nomes de mitologia do que devia se envergonhar.

Com estima, seu insignificante servo e amigo.

Padre Antônio Maximiano de Campos

Sant’Anna, 30 de Julho de 1894

Alguns nomes de recém-nascidos em Sant’Anna do Rio São João Acima, hoje Itaúna, foram de origem grega. Os pais e padrinhos ignoraram uma tradicional e costumeira nomenclatura religiosa. “Ora, em uma sociedade em que a religião católica era o principal balizador da mentalidade e da moral das pessoas, que findavam por comportar-se, social e politicamente, segundo os ditames da igreja [...]”, prevaleceu a influência grega, não obstante, “muito mais do que regular o clero e os fiéis, as Constituições Primeiras regravam a vida em sociedade do país (MAGALHÃES, 2011)”.

 

Eis os nomes de recém-nascidos de origem grega baptizados em Sant’Ana:

1866 - Aos quinze de outubro de mil oitocentos e sessenta e seis, baptizei solennemente a HERMÓGENES filho legítimo de Antonio Luis de Faria e Maria Paula da Conceição. Forão padrinhos o Vigário Delfino José Rodrigues e Francisca Martins Fagundes. O Vigário Antonio Maximiano de Campos.

1867 - Aos dez de fevereiro de mil oito centos e sessenta e sente, baptizei solennemente a ALEXANDRINA filha natural de Maria criôla escrava de Miguel Fernandes da Silva, forão padrinhos Antonio escravo de Jose Pereira de de Carvalho e Barbara escrava de Antonio de Carvalho. O Vigário Antonio Maximiano de Campos.

1867 - No mesmo dia baptizei solennemente a OLYMPIA filha legítima de Justino José Francisco e Maria Francisca de Jesus. Forão padrinhos Manoel ds Sanctos Ferreira e Francisca Carolina da Silva. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1867 - No mesmo dia baptizei solennemente a PHILOMENA filha legítima de Sebastião Pereira Rosa e Antonia Maria de Jesus. Forão padrinhos Jose Marques Annes e Umbellina Maria de Jesus. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1867 - No mesmo dia baptizei solennemente a PORPHYRIA filha natural de Isabel criola escrava de Francisco Nunes da Costa. Forão padrinhos Valentim criolo escravo de Manuel digo, Francisco Nunes e Thereza criola escrava de Manuel Nunes da Cunha. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1867 - No mesmo dia baptizei solennemente a SYMPHRONIO filho legítimo de João Jose da Fraga e Miquelina Francisca de Jesus. Forão padrinhos Silvanio Ribeiro de Camargos e Maria Francisca de Jesus. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - No mesmo dia baptizei solennemente a ALEXANDRE filho legítimo de Antonio Ferreira da Fonseca e Maria Venancia de Jesus. Forão padrinhos João Evangelista da Silva e Theresa Maria de Jesus. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - Aos vinte de agosto de mil oito centos e sessenta e oito baptizei solennemente a ALEXANDRINA filha legítima de Raphael Caetano Moreira e Laduvina Maria de Jesus. Forão padrinhos João Caetano Moreira e Balbina Candida da Purificação. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - Aos vinte e quatro de novembro de mil oito centos e sessenta e oito baptizei solennemente a CLETA filha natural de Rita Geralda de Jesus. Forão padrinhos João Rodrigues e Leonel Pires de Camargos. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - Aos nove de agosto de mil oito centos e sessenta e oito baptizei solennemente a JOVE filho legítimo de Firmino Francisco Soares e Fabianna Nogueira Duarte. Forão padrinhos Delfino Francisco Sares e Francisca Rodrigues de Faria.

1868 - Aos oito de dezembro de mil oito centos e sessenta e oito baptizei solennemente a LEONIDAS filho natural de Regina Antonia da Conceição. Forão padrinhos Vicente Gonçalves de Sousa e sua mulher Joaquina Maria da Conceição. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - No mesmo dia baptizei solennemente a PHILOMENA filha legitima de Vicente Teixeira da Cruz e Maria Joanna da Silva. Forão padrinhos Ignacio Francisco Teixeira e Maria Thereza de Jesus. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1868 - Aos vinte e três de janeiro de mil oitocentos e sessenta e oito baptizei solennemente a SYNPHRONIO filho natural de Phelipa criola escrava de João Antonio da Fonseca. Forão padrinhos L. Francisco Soares e Altina Francelina de Meneses. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1869 - Aos sete de janeiro de mil oitocentos e sessenta e nove baptizei solenemente FLAUSINA filha legítima de Baduíno Rodrigues Ribeiro e Joaquina Albina da Conceição. Forão padrinhos Antonio Jose da Matta e Flausina Maria de Jesus. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1869 - No mesmo dia baptizei solennemente a ONOFFRE filho legitimo de João Gomes Moreira e Jacintha Candida Medina. Forão padrinhos Antonio Alves da Cunha e Maria Alves Moreira. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1870 - No mesmo dia baptizei solennemente a DIÓGENES filho legitimo Silvestre M. Figueredo e Generosa. Forão padrinhos Aureliano Nogueira Machado e Amélia Nogueira Duarte. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1870 - Aos dose de julho de mil oitocentos e setenta baptizei solenemente EUCLIDES filho legítimo de Silverio Ribeiro de Camargos e Anna Nogueira Duarte. Forão padrinhos Francisco de Assis dos Santos Réo e Balbina Custódia da Silva. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1870 - No mesmo dia baptizei solennemente a THEÓPHILO filho legitimo João Francisco da Silva e Anna de Sousa. Forão padrinhos Antonio Bernardo e Maria filha de José Lopes Dias. O Vigario Antonio Maximiano de Campos.

1875 - ARTHEMISIA baptizada em 1875, filha legítima de Zacharias Ribeiro de Camargos e Anna Carolina Nogueira de Castro, morreu em dezesseis de setembro de 1944.

1877 - ARISTHÓTELES nasceu em dois de novembro de mil oitocentos e setenta e sete, baptizado em 1877, filho legítimo de Zacharias Ribeiro de Camargos e Anna Carolina Nogueira de Castro, morreu em 18 de agosto de mil novecentos e trinta e nove.

 Administrado o baptismo:

Mandamos a qualquer Pároco ou Sacerdote que solenemente houver de administrar o Sacramento de baptismo, que examine, e purifique sua consciência e lavando as mãos, vestido com sobrepeliz e estola roxa, se informará (não lhe constando) se é de sua Paróquia, se foi baptizado em casa, por quem, de que forma, quem há de ser o padrinho e madrinha, e do nome que há de ter a criança [...], e benzerá a água da pia batismal  na forma, que dispõem o Ritual Romano, guardando as mais cerimonias, que nele se mandam guardar: e usará de estola roxa até as palavras: Credis in Deum , e antes de as dizer tomará a estola branca, e com ela continue até o fim; e fará o baptismo por imersão, tomando a criança por debaixo dos braços com as costas viradas para si; e tendo intenção de baptizar, como manda a Santa Madre Igreja, pronunciando as palavras da forma do baptismo , meterá a criança na água com a boca para baixo uma vez pelo perigo, que pode haver sendo três  as imersões (Constituições, 1853, Livro I, Título. XII).

 

Sobre os padrinhos para o baptismo informa que:

Conformando-nos com a disposição do Santo Concílio Tridentino, mandamos, que no baptismo não haja mais que um só padrinho, e uma só madrinha, e que não admitam juntamente dois padrinhos, e duas madrinhas; os quais padrinhos serão nomeados pelo pai, ou mãe, ou pessoa, a cujo cargo estiver a criança; e sendo adulto, os que ele escolher [...] Mandamos outro sim, que o padrinho ou madrinha nomeados toquem a criança, ou a recebam ao tempo, que o sacerdote a tira da pia baptismal feito já no baptismo, e que o sacerdote, que baptizar, declare aos ditos padrinhos, como ficam sendo fiadores para com Deus pela perseverança do baptizado na Fé, e como por serem seus pais espirituais, tem obrigação de lhes ensinar a Doutrina Cristã, e os bons costumes.  (Constituições, 1853, Livro I, Título. XVIII).

 Sobre o procedimento com os registros nos livros:

Para que em todo o tempo possa constar do parentesco espiritual, que se contrai no sacramento do baptismo, e da idade dos baptizados, ordena o Sagrado Concílio Tridentino, que em um livro se escrevam seus nomes, e de seus pais, e mães, e dos padrinhos. Pelo que conformamo-nos com a sua disposição, mandamos que em cada Igreja do nosso Arcebispado haja um livro encadernado feito à custa da fábrica da Igreja, ou de quem direito for, o qual livro será enumerado, e assignado no alto de cada folha por nosso Provisor, Vigário Geral, ou Visitadores, e na primeira folha se declarará a Igreja onde é, e para o que há de servir; e na última se fará termo por quem o numerar em que se declare as folha que tem, e estará sempre fechado na arca, ou caixões da Igreja debaixo de chave, e os assentos dos baptizados se escreverão na forma seguinte: Aos tantos de tal mês, e de tal, ano baptizei, ou baptizou de minha licença o Padre N. nesta, ou, em tal igreja, a N. filho de N. e de sua mulher N., e lhe pus os santos Óleos; Foram padrinhos N. e N. casados, viúvos, ou solteiros, fregueses de tal Igreja, e moradores em tal parte. E ao pé de cada assento se assinará o Pároco, ou Sacerdote, que fizer o baptismo[...]. (Constituições, 1853, Livro I, Título. XX).

 

REFERÊNCIAS:

Organização e pesquisa: Charles Aquino

Transcrição:  Alan Penido e Aureo Nogueira da Silveira e Charles Aquino -  pesquisadores de História e Genealogia das famílias de Itaúna.   

MAGALHÃES, Antônio Carlos. Senador. Edições do Senado Federal,vol.79, Ano 2011, páginas 7 e 11 Disponível em:  https://livraria.senado.leg.br/livros-historicos/constituicoes-primeiras-do-arcebispado-da-bahia-vol-79

Edições do Senado Federal, vol. 79. Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, Brasília, DF, Conselho Editoria, 2011, p.12,16,26,28,29. Disponível em:  https://livraria.senado.leg.br/livros-historicos/constituicoes-primeiras-do-arcebispado-da-bahia-vol-79

Family Search: "Brasil, Minas Gerais, Registros da Igreja Católica, 1706-1999," database with images, 22 May 2014), Divinópolis > Santana > Batismos 1858, Dez-1874, Fev > images 146,151, 152,153,154, 164,169,173, 177, 184, 186, 189, 190, 192, 206,213, 215, 216 of 274; Paróquias Católicas (Catholic Church parishes), Minas Gerais.

Portal Prefeitura Municipal de Itaúna. Cemitérios Municipais. Consulta Registros nº 707, túmulo 3872 e Registro nº1724.  Disponível em: https://www.itauna.mg.gov.br/portal/servicos/402/cemiterios-municipais/

Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana -  Cúria Metropolitana.  Processo Matrimonial nº 111.743, 1894, Itaúna/MG.  

Fotografia Acervo:   Aristóteles - https://www.infoescola.com/filosofia/aristoteles/